MACE, o museu improvável que pôs Elvas no mapa da arte contemporânea

Inaugurado em 2007, o Museu de Arte Contemporânea de Elvas celebra 18 anos, período de afirmação enquanto polo de promoção urbana e cultural da região. A atestá-lo estão as mais de cinco mil visitas anuais. No centro de tudo está a Coleção António Cachola, composta por mais de mil obras de artistas contemporâneos. Júlia Serrão (texto)

Pode dizer-se um encontro do antigo com o moderno e o contemporâneo. O edifício emblemático, que acolhe em Elvas a arte produzida por artistas portugueses a partir da segunda metade do século XX, tem mais de 300 anos. Era o antigo Hospital da Misericórdia, que a Câmara de Elvas adquiriu em 2002, sendo depois adaptado ao espaço museológico. Situa-se mesmo no centro da cidade classificada pela Unesco como Património da Humanidade.

O Museu de Arte Contemporânea de Elvas (MACE), fundado e gerido pelo Município, surgiu da ideia do colecionador António Cachola, e da ligação à terra onde nasceu, resultando em grande medida do seu empenho pessoal. Em 2007, o economista alentejano, ex-diretor financeiro da Delta Cafés, cedeu ao Museu um conjunto de 300 obras que começara a colecionar na década de 90 e que propõe “uma cartografia dinâmica do sistema da arte português”, sem limites técnicos ou temáticos.

Desde então, a coleção cresceu, sendo atualmente composta por cerca de mil obras de mais de uma centena de artistas portugueses, que vão sendo “apresentadas em exposições temporárias e também emprestadas para outras exposições tanto a nível nacional como internacional”, explica Patrícia Machado, a diretora do MACE.

A coleção António Cachola “está representada nas mais diversas categorias” de arte, da escultura à pintura, do vídeo ao desenho, gravura, performance, fotografia e instalação. São obras produzidas “entre a década de 80 e a atualidade”, por artistas “que vão dos nomes mais consagrados e de referência, aos mais jovens” talentos na arte contemporânea.

José Pedro Croft é um dos artistas mais representados na coleção, existindo em depósito 58 peças da sua autoria, entre gravuras e esculturas. Ainda assim, é ultrapassado por Julião Sarmento com 72 obras, no caso fotografias. Encontram-se ainda trabalhos de Joana Vasconcelos, Cabrita Reis, Francisco Tropa, Vhils e Mané Pacheco.

A diretora do MACE rejeita a designação de “tesouros” da coleção, dizendo que, embora possa falar-se em “obras mais emblemáticas”, na arte contemporânea estão permanentemente a surgir trabalhos “novos e interessantes”, não se podendo, assim, considerar uma peça “especial por ser mais antiga”.

Muita gente questionou a viabilidade de um museu de arte contemporânea no Alto Alentejo, durante a fase de preparação. Mas contrariando conjeturas, o MACE tornou-se num importante “polo de dinamização urbana e cultural da região”, e afirma-se como ponto de referência nos itinerários da arte contemporânea.

A diretora diz que o crescimento e a “excelência” da coleção e a sua afirmação a nível nacional e internacional “foram ajudando a que o museu ganhasse um lugar de respeito”. Em 2016, a coleção recebeu o Prémio ‘A’ de Colecionismo Privado, atribuído pela Fundação ARCO, de Madrid, dedicada à promoção e ao desenvolvimento da arte contemporânea e que, todos os anos, organiza uma das mais importantes feiras internacionais de arte.

Inaugurado a 6 de julho de 2007, o MACE assumiu como missão “elevar a oferta cultural de Elvas, contribuindo para a descentralização do acesso à arte contemporânea”, e promover o concelho através da sua coleção e exposições nacionais e internacionais. Dezoito anos depois, pode dizer-se que está a cumprir os objetivos traçados. Desde logo porque recebe à volta de cinco mil visitantes por ano, “muitas pessoas ligadas ao meio”, artistas, colecionadores e galeristas que “já colocaram o MACE no mapa dos locais a visitar”, sendo ainda percurso de muitas famílias anónimas provenientes de vários pontos do país.

Os projetos “com a cidade”, refere a diretora, trazem ainda mais visitantes, sendo disso exemplo o que celebrou os 15 anos de existência do museu, “em que toda a cidade se envolveu na arte contemporânea”, e para o qual foram “convidadas várias instituições”. A Festa da Arte em Rede na Região do Alentejo (FARRA) foi ainda mais longe. O evento de artes visuais promovido pelo museu, que teve lugar, pela primeira vez, entre 28 de junh de 25 de agosto de 2024 alcançou cerca de 30 mil visitantes.

“Nessa ocasião foram organizados 30 projetos expositivos, com a participação de coleções privadas portuguesas, entidades sem fins lucrativos e artistas convidados, que ocuparam não só o museu como outros espaços emblemáticos da cidade. Foi um evento que tinha obras em todos os espaços culturais da cidade”, nota Patrícia Machado.

VERTENTE EDUCATIVA

Aproximar a instituição da comunidade local e “fidelizar novos públicos” desde o pré-escolar é outra “missão” do museu, missão essa que envolve as escolas num conjunto de atividades pedagógicas. “Trabalhamos por temática de exposição, logo fazemos sempre um programa novo. Mas também vamos vendo o que resulta melhor, aperfeiçoando, e dando resposta ao que sabemos que é mais procurado”.

Patrícia Machado diz que “já se nota” diferença entre as crianças de hoje e as de quando o MACE ainda não existia na região, no que respeita a conhecimentos e sensibilização para a arte. “Já não estranham como acontecia no início, porque estão habituadas a frequentar” o espaço.

Com a programação expositiva, o museu pretende apresentar a coleção através de mostras temáticas e “estabelecer parcerias” com outros museus portugueses, como Serralves, Culturgest ou Berardo, e espanhóis, nomeadamente com o Museu Estremenho Ibero-Americano de Arte Contemporânea (MEIAC) de Badajoz, para, deste modo, “descentralizar” a arte contemporânea “dos grandes centros urbanos”. Sendo “muito semelhantes”, a relação do MACE com o MEIAC é “muito boa”, com troca de visitantes de um lado e do outro da fronteira.

A ideia é usar o seu posicionamento ibérico estratégico para promover, nacional e internacionalmente, a arte contemporânea produzida por artistas portugueses. “Estamos aqui num percurso que facilita essa dinâmica. As fronteiras são sempre zonas de transgressão e a arte contemporânea, aqui, encaixa perfeitamente”, resume a diretora.

Para além da programação anual, todos os anos há “alguma atividade comemorativa dos aniversários”, explica a diretora, para dar conta que a deste ano ainda não está arquitetada, sendo que o museu gostaria de repetir em 2026 a realização do projeto FARRA.

O Museu de Arte Contemporânea de Elvas está inserido na Rede Portuguesa de Museus desde 2015, sendo que neste momento está “a usufruir de uma programação em parceria com outras instituições nacionais”, com benefício para todos. “Os projetos não ficam só concentrados em Lisboa e no Porto”, sendo que há “uma partilha muito interessante” de informação e recursos financeiros e técnicos.

Patrícia Machado diz que o MACE é “um museu ativo” com uma programação anual que “acompanha as tendências do que se faz em Portugal, em colaboração com outras instituições com boas referências de práticas artísticas”, como a Culturgest, o Cento de Arte Oliva e a Appleton, a que também está associado. “Portanto”, conclui, “o futuro do MACE está completamente assegurado”.

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