As tradições musicais populares são a fonte de inspiração de OMIRI, que privilegia o contacto direto com os portadores dessas tradições. O trabalho será apresentado ao vivo em Portugal, Espanha e Canadá, ao longo dos próximos dois meses.
O novo disco de OMIRI, “Modas novas e algumas velhas”, a sair na próxima sexta-feira, no mesmo dia em que tem a sua primeira apresentação ao vivo, na Sociedade Harmonia Eborense, em Évora, é um “remix”, uma mistura de práticas musicais populares, sincronizando formas e expressões da tradição rural e linguagens da cultura urbana, através de novas tecnologias e da definição de ‘samples’ digitais, concebidos com sons recolhidos, reais.
“As tradições continuam vivas, estão é um bocadinho longe do grande público em geral, mas os artistas mais ‘mainstream’ da pop, do rock, etc., têm estado a descobrir e a valorizar as nossas tradições e a perceber que Portugal é um país riquíssimo com coisas lindíssimas e únicas, e têm estado a incorporar essas tradições nas suas novas composições”, afirmou Ribeiro Casais em entrevista à agência Lusa.
Sobre o seu modo de criação musical, à base de misturas em computador, Ribeiro Casais disse que funciona muito pelo “passa palavra”, isto é, as pessoas falam entre si que o músico está a fazer recolhas musicais. “Eu vou ter com as pessoas, mostro-lhes o trabalho que estou a fazer, às vezes não percebem porque estou a gravá-las, mas recebem-me sempre de braços abertos. Passo muito tempo com elas a ouvir o que têm para me dizer e a cantar”, contou o músico. “Estou ali de corpo e alma a ouvir, a pessoa está a dedicar-me o seu tempo”.
A gravação é feita em áudio e vídeo e, depois, em casa, no computador, ouve e vai percebendo os temas que lhe interessam e o que lhes pode acrescentar.
“Oiço, ponho-lhe a voz e, ao mesmo tempo que trabalho o som, trabalho o vídeo”, disse o músico, enfatizando a componente visual do projeto.
“Começo a ouvir e vão surgindo as ideias. Conforme oiço penso: ‘Aqui fica bem uma batida tipo uma sola’, e vou buscar uma sapateira a bater uma sola. Depois tenho uns pratos e vou buscar uma senhora a tocar um sininho, depois preciso de uns bombos e vou buscar o grupo de bombos que tenho”, explicou, referindo que “toda a eletrónica, exceto alguns sintetizadores e alguns baixos, é feita de sons das recolhas”.
“O som do disco é diferente, tem muito espaço, ouve-se os passarinhos, os cães, alguém com um trator lá atrás, tem muito espaço, é tudo ao ar livre. É um som vivo, não o de estúdio onde tudo é muito cirúrgico. Eu acho isso engraçado, até os próprios ‘loops’ são tirados do vídeo, porque trabalho simultaneamente o áudio e o vídeo”.
O músico acentuou a importância visual nos seus concertos, onde os vídeos são exibidos: “Nos concertos há essa interação com o vídeo. Eu estou a tocar com o vídeo, estou a tocar com eles, e isto cria uma empatia maior com quem assiste aos concertos”.
Além de Évora, o projeto OMRI vai ser apresentado, no dia 15 de fevereiro, na Sala Rebullón, em Moz, na Galiza, em Espanha; na conferência internacional Folk Aliance, em Montreal, no Canadá, no dia 20 de fevereiro; e, no dia 22, ainda neste país, no espaço Lighthouse Immersive, em Toronto.
Regressando a Portugal, já tem datas agendadas para março, no Art Haus Club, em Faro, no dia 15; no Hotel Tivoli, em Lisboa, no dia 19; e em Louriga e Seia, respetivamente, nos dias 28 e 30 de março.
O músico disse à Lusa que optou por apresentar o álbum em espaços mais pequenos, nos quais se sentisse próximo do público.
O álbum é constituído por 17 temas entre eles, “Ó ti ó tirititi”, “Ai Lé” e também “Valsinha”, um original de OMIRI.
“Pé com Pé”, uma composição que combina a música tradicional portuguesa com as sonoridade contemporâneas, exemplifica o trabalho do projeto: é um tema recolhido com o Rancho Infantil Os Fidalgos da Trofa, conta com as vozes de Beatriz Melo, o bombo de Natércia Cunha, o triângulo de Adélia Simões, todas de Águeda, e ainda com sons de louça a ser partida por Alexandra Sousa, de uma fábrica em Alcobaça, acompanhados pela viola braguesa de OMRI.
“Casaco sem Mangas” abre o alinhamento do álbum que inclui ainda “Cala-te aí ó Cachota”, “Tirana”, “Se me chegas a Mostarda à Venta”, “Tenho 7” e o tema de origem galega “Pasodobre de Mangüeiro (Olvídame)”.
“Este disco é uma celebração das tradições portuguesas, que são muito ricas”, disse o músico, realçando que não é numa perspetiva nacionalista. Para Ribeiro casais “a nossa cultura resulta, também ela, de uma grande mistura de culturas, e hoje há pessoas vindas de outras geografias a viverem as nossas tradições”.
Do grupo de músicos faz parte um queniano, a bater o junco, numa referência a Alcobaça, onde se fazem os cestos e os tapetes a partir desta planta, “já aculturado à nossa tradição, sendo que ele traz uma mais-valia da sua cultura”.
Num prognóstico, o músico disse: “Temos hoje uma comunidade migrante, e a nossa tradição vai misturar-se com a deles e vai incluir, e é assim que eu vejo a música, não uma coisa fechada, mas exatamente algo em movimento e a caminhar. […] Um ser humano a partilhar, a usufruir e a partilhar com outros”, acrescentou.
O termo OMIRI, para batizar o projeto, foi o músico buscá-lo ao léxico brasileiro, referindo-se a um tipo de árvore muito grande que produz uma essência balsâmica, “e o projeto, tal como a árvore, cresceu por si próprio”.
OMIRI tem atuado em vários festivais nacionais e internacionais, nomeadamente Womex, Reepperbahn, Eurosonic, Rudolstadt, Kaustinen, Viljandi, Dranouter, Live at Heart, Exib Musica, Iminente, WestWay Lab, Med, Artes à Rua.
O álbum “Baile Electrónico” (2017) esteve no pódio nas tabelas World Music Charts Europe e recebeu em 2020 Prémio Inatel, nos Iberian Festival Awards.
OMIRI desenvolve também projetos especiais com comunidades locais, direcionados a regiões especificas.
Este novo álbum é o resultado de oito anos de pesquisa, durante os quais trabalhou paralelamente em espetáculos específicos para os concelhos de Évora, Pombal, Alcanena, Tomar e Setúbal, e dos quais resultaram livros/CD, com uma reinterpretação da cultura de cada região.