Ao percorrer o interior alentejano, deparamo-nos com uma realidade inescapável: aldeias cada vez mais vazias, escolas a fechar por falta de alunos, uma população envelhecida e jovens que partem à procura de oportunidades. A desertificação demográfica é, talvez, o maior desafio com que o Alentejo se depara no século XXI.
Os números não mentem. Em algumas vilas, mais de 30% da população tem mais de 65 anos. As casas fechadas multiplicam-se, os comércios tradicionais encerram e os terrenos agrícolas são abandonados. Esta tendência, iniciada há décadas com a mecanização da agricultura e acentuada pela concentração de serviços públicos nas grandes cidades, requer uma análise honesta e uma intervenção urgente.
As causas deste problema são complexas e interligadas. A falta de oportunidades de emprego qualificado força os jovens a emigrar. A escassez de serviços essenciais, desde a saú- de à educação, torna a vida no interior cada vez mais difícil.
A centralização de decisões em Lisboa ignora sistematicamente as necessidades específicas da região. A ausência de uma estratégia coerente de desenvolvimento regional transformou medidas pontuais em soluções temporárias e ineficazes.
Contudo, acredito firmemente que este ciclo pode e deve ser quebrado, através de políticas públicas ambiciosas e orientadas para resultados concretos.
Primeiro, é necessário revolucionar a nossa abordagem ao teletrabalho. A pandemia demonstrou que muitas funções podem ser realizadas à distância. O Alentejo, com a sua qualidade de vida e os seus custos habitacionais mais baixos, pode atrair estes “nómadas digitais” através da concessão de incentivos fiscais específicos e da criação de uma rede de exce- lentes centros de ‘coworking’ em vilas e aldeias.
Em segundo lugar, é necessário descentralizar os serviços públicos de facto. Não basta manter uma repartição aberta dois dias por semana. É necessário transferir departamentos inteiros de ministérios para cidades alentejanas, a fim de criar emprego qualificado e dinamizar a economia local.
Em terceiro lugar, devemos apostar em polos de ensino superior e investigação especializados. Um centro de investigação em agricultura sustentável ou energias renováveis pode transformar-se num motor de inovação e de fixação de jovens talentos.
Em quarto lugar, é essencial criar incubadoras de empresas focadas nos recursos endógenos
da região. O turismo sustentável, a agroindústria de valor acrescentado e as energias limpas são setores com potencial para criar empregos de qualidade.
Por fim, é necessário garantir um acesso equitativo à saúde e à educação. São medidas fundamentais: programas de incentivo à fixação de médicos de família, apoio à habitação para professores e um serviço de transportes públicos que efetivamente ligue as pequenas localidades.
O Alentejo não está condenado à desertificação. Pelo contrário, reúne todas as condições para se reinventar: um património cultural rico, uma qualidade ambiental excecional, produtos agroalimentares de excelência e espaço para crescer. O que falta é visão política e coragem para implementar mudanças estruturais.