A poucos quilómetros de Évora, num dos mais belos recantos do Alentejo, ergue-se o Cromeleque dos Almendres — um dos mais antigos e impressionantes monumentos megalíticos da Europa. Mais antigo do que Stonehenge, mais misterioso do que qualquer manual de arqueologia consiga explicar. E, no entanto, inacessível.
Sim, inacessível. Porque a estrada que leva até ele é de terra batida, esburacada, lamacenta no inverno e traiçoeira no verão. Porque a Câmara Municipal de Évora, apesar de ter anunciado com pompa e circunstância a sua “reabertura” em setembro de 2024, nunca cuidou de garantir o mais básico: que se possa lá chegar.
O acesso ao monumento faz-se por terrenos privados, mas está formalmente assegurado através de um protocolo entre os proprietários e a autarquia. Ou seja, a responsabilidade da sua manutenção recai sobre o município. Mas o que se encontra no terreno é um caminho sem condições: buracos profundos, ravinas abertas pela erosão e lamaçais contínuos sempre que chove.
Em setembro do ano passado, num gesto de celebração pública, a autarquia anunciou a reabertura do Cromeleque dos Almendres com entusiasmo. Foi apresentada a redescoberta de um novo menir, organizaram-se visitas com técnicos e meios de comunicação social, e criou-se a ideia de que o monumento estaria novamente plenamente acessível. No entanto, as primeiras chuvas de outono bastaram para revelar que nada tinha sido feito quanto ao acesso.
As empresas de turismo megalítico suspenderam as visitas ao local, por razões de segurança, e muitos turistas acabaram com os veículos atolados no meio do campo.
Investigadores, alunos e visitantes ficaram impedidos de chegar ao monumento. As visitas escolares, previamente planeadas, foram canceladas. E, ao contrário do que se fazia crer, a estrada continuava exatamente como antes — ou pior.
E tudo isto é tanto mais grave quanto mais se conhece a importância do Cromeleque dos Almendres. Trata-se de um recinto com cerca de cem monólitos dispostos em alinhamentos que sugerem uma função astronómica, ritual e simbólica. Um espaço sagrado de observação do solstício e do equinócio, com inscrições de arte rupestre, usado durante milénios por comunidades humanas que aqui deixaram um dos mais antigos testemunhos da arquitetura sagrada da humanidade.
Não se trata, pois, de um capricho turístico. Trata-se de um monumento fundamental para a compreensão da pré-história europeia, e de um bem cultural classificado, que merece respeito, dignidade e acesso. O mínimo exigível seria uma estrada praticável durante todo o ano, com sinalização adequada e eventualmente um serviço de transporte alternativo em dias de maior pluviosidade.
O que está em causa não é apenas uma omissão técnica. É uma escolha: a de anunciar antes de cumprir, a de celebrar antes de preparar, a de inaugurar antes de garantir condições. E o resultado é este: um monumento “reaberto” apenas nos comunicados, mas inacessível na realidade.
A defesa do património não se faz apenas com eventos, painéis informativos ou fotografias de inauguração. Faz-se com caminhos transitáveis, com respeito pelos visitantes, com responsabilidade para com os investigadores e com a noção de que o passado é um dever — e não apenas um pretexto para discursos.
O Cromeleque dos Almendres merece ser visitado, compreendido e cuidado. E nós, enquanto comunidade, temos o dever de garantir que não fica esquecido atrás de um lamaçal.