Existe a perceção de que Beja foi sempre uma terra de cereais e de pão, não tanto de uvas e de vinho. Esta imagem acentuou-se a partir de 1899 com a “Lei da Fome”, mas principalmente durante o Estado Novo, com a “Campanha do Trigo”, que pretendia aumentar consideravelmente a produção deste cereal através de uma política protecionista e de incentivos à produção. Daí os barros de Beja terem-se trans- formado numa vasta zona de searas no século XX.
No entanto, se recuarmos a meados do século XIX ou a tempos mais longínquos, constatamos que os campos de Beja eram de policultura, com zonas de cereais, vinhas, olivais, montado, pastagens e hortas. Procurava-se instalar cada cultura no local mais propício e diversificar as produções, “não colocando todos os ovos no mesmo cesto”.
A paisagem alentejana, e em particular a de Beja, foi-se moldando e adaptando ao longo dos tempos ao mercado e às políticas governamentais. Neste momento, o Alentejo é a região líder no mercado nacional na categoria de vinhos engarrafados de qualidade com Denominação de Origem (DOC Alentejo) ou Indicação Geográfica Regional (Alentejano), tendo uma quota de mercado na ordem dos 40%.
Nos últimos 30 anos a área de vinha no Alentejo passou de cerca de 13 mil hectares para quase 23 mil hectares e de cerca de 40 produtores/engarrafadores passou-se para quase 360, tendo a produção de vinho crescido de 40 milhões de litros para mais de 100 milhões.
O concelho de Beja também se integrou nesta expansão da mancha vitivinícola alentejana no início do século XXI, altura em que surgiram os primeiros vinhos engarrafados de Beja da era moderna, fruto da aposta de diversas casas agrícolas na plantação de vinhas, na vinificação e na comercialização de novas marcas.
Algumas destas empresas foram fruto de investimento estrangeiro ou oriundo de outras zonas do país. Contudo, algumas casas agrícolas tradicionais do concelho de Beja já tinham nessa altura instaladas vinhas com dezenas de anos. O seu negócio centrava-se até aí na venda de uvas para outras empresas, mas nesse momento transformaram-se em produtores/engarrafadores. O concelho passou a dispor de um conjunto de adegas modernas com tecnologias de última geração.
As novas vinhas do Alentejo, e as do concelho de Beja em particular, começaram a instalar-se em locais onde nem sempre tinham existido. As novas vinhas foram plantadas com alinhamento e condução modernas, com rega gota a gota, com talhões diferenciados para cada casta e sem consociação com outras culturas. Neste momento existem oito empresas no concelho de Beja que certificam Vinho Regional Alentejano, tendo cerca de 746 hectares de vinha e uma produção anual de três a quatro milhões de litros de vinho.
As adegas que produzem vinho no concelho de Beja salientam-se também pelo facto de possuírem unidades de turismo de grande qualidade. A Herdade da Malhadinha Nova é um dos enoturismos portugueses mais premiados, com um conjunto de quartos, suites e villas espalhadas pela propriedade, tendo um vinhedo com 80 hectares e uma gama diversificada de vinhos (Monte da Peceguina, Malhadinha, Pequeno João, Menino António e Marias da Malhadinha, entre outros) com base em castas portuguesas e algumas estrangeiras e uma imagem muito cuidada e sofisticada.
A Casa de Santa Vitória tem três hotéis, dois deles inaugurados recentemente, e 130 hectares de vinha. Possui uma linha de vinhos coerente que se inicia com o vinho Santa Vitória Versátil, a gama intermédia constituída pelos vinhos Santa Vitória Seleção e Santa Vitória Reserva, vários vinhos monovarietais e os topos de gama Santa Vitória Grande Reserva e Inevitável.
A Herdade dos Grous dispõe de um hotel rural dividido por vários núcleos em torno da barragem e uma vinha com 133 hectares. Os seus vinhos têm grande reconhecimento no mercado, sendo identificados como pertencendo ao Alentejo clássico, com as marcas Herdade dos Grous, Herdade dos Grous 23 Barricas, Herdade dos Grous Moon Harvested e Herdade dos Grous Reserva.
A Herdade do Vau situa-se no vale do rio Guadiana e proporciona aos visitantes a imersão nesta zona de grande biodiversidade e a experiência de viver num antigo monte alentejano renovado. Possui cinco hectares de vinha que originam os vinhos Riso e Riso Reserva.
Estes quatro enoturismos proporcionam um vasto leque de experiências em torno do vinho e da vida no campo que vão desde a participação nas vindimas a passeios equestres ou em balão de ar quente. Pode-se ainda visitar a adega e realizar provas de vinhos e jantares vínicos nos seus restaurantes.
VINHOS QUE CONTAM HISTÓRIAS
Já a Herdade da Mingorra soma 130 hectares de vinha, tendo alguns talhões com mais de 40 anos. Tem um portefólio muito amplo, no qual se destacam os vinhos Terras D’Uva, Mingorra Colheita, Mingorra Reserva e Vinhas da Ira.
A Herdade Paço do Conde é a que tem a maior área de vinha no concelho de Beja, atingido atualmente os 200 hectares, maioritariamente de uvas tintas. Possui um conjunto de marcas muito variado, embora a Herdade Paço do Conde seja a que tem maior notoriedade.
A Herdade da Figueirinha é a que se situa mais perto da cidade de Beja, com 40 hectares de uva tinta. Aposta em marcas com nomes regionais (Nã Te Rales, Cantando, Fonte Mouro) e impactantes (Intuição, Insónia, Amnésia) e em vinhos modernos (monovarietais) e tradicionais, como os vinhos de talha.
Finalmente, a Herdade da Poupa foi a última adega a certificar vinho com o nome Poupinha, tendo atualmente 23 hectares de vinha. Nestas últimas quatro empresas é possível visitar as vinhas e as adegas e realizar provas de vinhos.
Em suma, os vinhos do concelho de Beja surpreenderam os consumidores num primeiro momento e afirmaram-se ao mostrarem uma grande pureza da fruta, com aromas e sabores exuberantes, utilizando para isso uma combinação de castas regionais e internacionais e aliando métodos ancestrais às novas tecnologias. São vinhos que contam histórias do passado, do presente e do futuro.