Azeite há muito. O de Joaquim Ramalho é verde e sem filtragem

Joaquim Ramalho, natural de Estremoz, regressa à terra onde nasceu apostado em reavivar os campos e criar o seu próprio azeite. Verde. Mariana Miguéns (texto)

O azeite, já se sabe, é um dos produtos alimentares mais antigos e valiosos, com uma história de milhares de anos. A produção envolve uma série de etapas, desde a colheita da azeitona até à extração do óleo e ao seu engarrafamento. Joaquim Ramalho abraça todo este projeto de produção, apostando na colheita tradicional, onde as azeitonas são apanhadas à mão, derrubadas das árvores com o auxílio de varas. Este método, assegura, é mais cuidadoso, tanto para as oliveiras como para o ecossistema que as rodeia, do que a utilização de máquinas vibratórias, um processo mais rápido e eficiente, geralmente utilizado nos grandes olivais, mas que “danifica” as oliveiras.

Agora aproxima-se a época da colheita, que depende do grau de maturação das azeitonas e da qualidade do azeite desejado. Azeitonas mais verdes produzem azeite com sabor mais amargo e picante, enquanto as mais maduras dão origem a um azeite mais suave e frutado. Joaquim Ramalho prefere as primeiras, é ao azeite verde que se dedica, não sem alguns sobressaltos. Uma das maiores dificuldades prende-se com o facto de quase todos os lagares da região só começarem a receber azeitonas a partir de novembro, enquanto a apanha para o azeite verde é feita logo em setembro, ou início de outubro.

Após a colheita, as azeitonas são limpas para serem removidas as folhas, galhos, e outras impurezas. Esse processo geralmente é feito por meio de sistemas de ventilação e lavagem com água. Azeitonas de qualidade inferior, danificadas ou defeituosas são removidas para garantir que apenas os frutos de alta qualidade são usados na produção do azeite.

No método tradicional, as azeitonas são moídas em moinhos de pedra para formar uma pasta. Este método é mais lento e geralmente utilizado em produções menores. Outro consiste na utilização de lâminas metálicas para triturar as azeitonas, processo mais rápido e eficiente para produções em larga escala.

Já a filtragem é opcional. O azeite pode ser filtrado para remover partículas microscópicas de bagaço e água, o que resulta num produto mais claro e estável. Alguns produtores preferem não o fazer, alegando que desta forma se mantêm mais sabor e nutrientes. É o caso de Joaquim Ramalho, que escolheu não filtrar “para obter um azeite mais frutado e saboroso, apesar de durar menos tempo”. O que nos conduz ao próximo passo, o armazenamento.

Para o guardar o ideal são tanques de aço inoxidável em ambientes controlados para minimizar a exposição ao ar, luz e calor, elementos que podem degradar a qualidade. É depois engarrafado em recipientes opacos para proteger o produto da luz. A embalagem é crucial para manter a qualidade até ao consumo. Aqui a opção foi pela utilização da lata, em vez do vidro.

Joaquim Ramalho conta que a produção de azeite é uma tradição familiar. Mas quis ir mais longe. “Queria saber ao que sabia o meu azeite, que qualidade tinham as minhas azeitonas”. Encontrou solução na Herdade do Freixo do Meio, próximo de Montemor-o-Novo, onde existe um lagar comunitário que lhe permite produzir o tal azeite verde, moer as azeitonas no mês de setembro.

“Comecei a produzir em pequena quantidade, apenas para a família… ainda hoje produzo em pequena escala. Da colheita que levo para o lagar, metade é-me paga em azeite, a outra metade em dinheiro”, diz o produtor, sublinhando já ter vendido, “por diversas vezes”, no mercado de Estremoz, onde conheceu um casal de artistas, italianos, que se interessou pelo projeto e lhe falou de um festival em Itália precisamente dedicado a este tipo de azeite.

“A azeitona está melhor, mais sadia, quando ainda está em verde. No final da época tradicional, por vezes, perde-se metade da colheita por causa da gafa, por estar roída ou mirrada. A minha ideia é aproveitar para fazer o meu azeite, verde, e criar nos meus campos um ecossistema sem rega, uma agrofloresta que combine a agricultura com a silvicultura, de forma integrada e sustentável”, acrescenta.

Joaquim Ramalho garante que este método “aproveita as interações naturais entre as plantas para criar um ecossistema produtivo e equilibrado”, com benefícios a nível da conservação dos solos, pois previne a erosão, e da biodiversidade, permitindo criar diversos tipos de habitats.

Na exploração tudo é planeado “ao milímetro”. É assim, por exemplo, com as linhas de cultivo, “um trabalho de associação de plantas para criar um ecossistema”, tirando o melhor proveito de cada uma. “O que aqui tenho é, basicamente, um campo experimental onde dou vida às minhas ideias e experiências, mas este solo tem muito mais matéria orgânica quando comparado com outros”.

Das duas variedades de pereira que plantou só uma sobreviveu, no trigo teve ainda menos sorte, mas vai continuar a tentar. A ideia é que o trabalho da terra permita melhorar a infiltração de água no solo, “contribuindo para a recarga dos aquíferos”, ao mesmo tempo que diminui as necessidades de rega. 

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