Em Portugal, terra de poetas e marinheiros, o Sr. Manel é uma figura conhecida, mas não muito querida. Ele é o Manual de Instruções, aquele que chega com cada novo gadget, cada móvel por montar, cada aparelho eletrónico que promete facilitar a vida. Mas o Sr. Manel enfrenta um problema: os portugueses, e não só, parecem ter uma alergia crónica a ele.
Imagine a cena: João compra uma estante nova. A caixa é aberta, peças espalhadas pelo chão, e lá está o Sr. Manel, imaculado em seu plástico protetor. João olha para ele, suspira e coloca-o de lado. “Para quê complicar?” – ele pensa. E assim começa a aventura de encaixar A no B, de parafusar sem olhar, de montar seguindo o instinto – aquele mesmo que guiou os antepassados a descobrir novos mundos. E no fim, inevitavelmente, sobra um parafuso, sob o olhar desaprovador do Sr. Manuel.
Mas os tempos mudaram, e agora há um novo jogador na cidade: o Mister Tube, vulgarmente conhecido como Youtube. Com seus vídeos dinâmicos e tutoriais passo a passo, ele conquistou o coração da juventude. Mister Tube é o herói dos tempos modernos, o salvador dos desmontados, o guia dos perdidos na montagem.
Enquanto o Sr. Manel fica a ganhar pó na prateleira, Mister Tube brilha nos écrans dos smartphones. Maria, prima do João, monta a mesma estante em metade do tempo, seguindo um youtuber carismático que explica tudo com uma paciência que o Sr. Manel nunca teve.
O Sr. Manel, porém, não desiste. Ele sabe que tem seu valor. “E se a internet cair?” – ele questiona. “E se o vídeo for rápido demais?”. Mas suas palavras se perdem ao vento, enquanto os jovens portugueses deslizam os dedos pelos écrans, procurando o próximo vídeo que lhes mostrará como viver, como montar, como ser.
A verdade é que o Sr. Manel e o Mister Tube representam dois mundos. Um é o da tradição, da paciência, da atenção aos detalhes. O outro é o da rapidez, da eficiência, da gratificação instantânea. E na batalha entre os dois, parece que o Mister Tube leva a melhor.
Mas não se engane, o Sr. Manel ainda tem seus momentos. Quando a bateria acaba, quando o wi-fi falha, quando o vídeo não carrega, é a ele que todos recorrem. E ele, com a dignidade de quem sabe esperar, abre suas páginas e oferece, sem rancor, a solução tão procurada.
E assim, na eterna dança entre o antigo e o novo, o Sr. Manel continua sua existência humilde, esperando pacientemente por aquele momento de reconhecimento que ele sabe que, mais cedo ou mais tarde, virá. Até lá, ele permanece como um símbolo não tão sutil da teimosia e da imprudência dos por- tugueses, e não só, em lidar com instruções. Porque, afinal de contas, quem precisa de um manual quando se pode simplesmente “dar um jeitinho”.