Abílio Amiguinho: “Com os mais velhos”

A opinião de Abílio Amiguinho, professor jubilado do ensino superior

Outubro mal chega e fica logo no “Dia do Idoso”. É a designação que ainda prevalece. Muito provavelmente retendo a representação, e formas relacionadas de cuidar, das “pessoas idosas” ou dos “mais velhos”, expressão que em mim mais colhe. Considero que, em termos de respostas sociais para esta camada etária, talvez não estejam muito melhor do que nós, mas a aceção que deles tomei pode ajudar a melhorar a forma como vemos este largo setor da população e os modos como socialmente agimos.

Em primeiro lugar vendo-os efetivamente como mais vividos, experimentados e sabedores. E que, se a saúde e a mobilidade os deixarem, continuam a fazer por si e pelos outros. Sobretudo, não voltaram a ser crianças, a avaliar como certas práticas de quem os acolhe e julga proteger, infantilmente os tratam, numa representação de senso comum que os devolve à infância, no fim da vida.

Senso comum que igualmente considera que, por essa razão e mais outras que o povoam infundadamente, a esmagadora maioria dos mais velhos estão num lar, a que a legislação atual chama de estrutura residencial. Desconcertados ficavam os meus estudantes quando lhes revelava que os números eram exatamente ao contrário daqueles de que estavam convictos.

Só cerca de 20% dos mais velhos, mesmo num distrito como Portalegre, talvez o mais envelhecido do país, são abrangidos pelas respostas sociais reconhecidas como lar, centro de dia ou apoio domiciliário. Cerca de 80% vivem, pois, por si, ou com uma mãozinha (e o carinho e afeto) da família, dos vizinhos ou da comunidade. Muitos deles acima dos 80 anos, como as senhoras que as televisões nos deram a conhecer recentemente: uma de 100 anos e outra de 93. A primeira não quer sair da sua casa para fazer algo de elementar na sua vida, como deitar-se ou levantar-se à hora que quer; a segunda, quer mais coisas na sua aldeia para que, na sua casa, se sinta menos isolada.

Em segundo lugar, ter consciência destes dados talvez nos possa levar a observar e a intervir de modo distinto. Isto é, agindo profissional e institucionalmente com os mais velhos no ambiente socioecológico das suas casas, mantendo ou reabilitando as redes de solidariedade primárias. As universidades seniores são uma mais-valia. Mas são necessárias outras intervenções menos formalizadas que conjuguem o educativo e o social, numa perspetiva intergeracional, como desenvolvemos na Cooperativa Operária Portalegrense, fazendo do conceito de envelhecimento na comunidade, ou “entre os seus e as suas coisas”, o nosso guia.

Há cada vez mais projetos e iniciativas a dar esperança a este domínio da inovação social. Trazendo os mais velhos para o espaço público, através de atividades diversas, de mobilidade, de recreação, de formação e de fruição de iniciativas culturais, que dão sentido à vida nesta fase, ainda que no fim do dia regressem a suas casas. Estar em casa não pode ser ficar isolado nela.

Contas feitas retardar ou reduzir a institucionalização dos mais velhos, preservando a sua autonomia, nos países que ousaram fazê-lo, provou-se que até fica mais barato a todos e principalmente ao Estado. E tudo em prol do seu bem estar e da sua felicidade.

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