Quando um cliente da agência imobiliária, também amigo, lhe pediu para procurar uma pequena propriedade no Alentejo, Rui Herdadinha estava longe de imaginar que essa demanda lhe haveria de mudar a vida. Soube da existência de um terreno de 4,5 hectares com alguns edifícios cuja construção tinha ficado a meio, bem perto do Vimieiro (Arraiolos), meteu-se ao caminho, percorreu o espaço, entrou num deles. “Nesta janela”, recorda, “estava uma placa da agência bancária a dizer vende-se. Tirei-a e pus-me a espreitar”.
Nesse momento, daquela janela, Rui Herdadinha viu o mundo. E nesse mundo aquela propriedade já não estava à venda. “Não voltei a colocar a placa. Gostei tanto que, para mim, ficou resolvido”. Como o amigo, entretanto, desistiu do negócio, percebeu que o que vira daquela janela fora, afinal, o seu próprio futuro. “Já tinha dado a minha palavra à Caixa Agrícola, virei-me para a minha mulher e disse-lhe que a solução seria ficarmos com a quinta”.
Diga-se que não se trata de um homem que acredite em acasos, ou coincidências. “Acho que estava mesmo destinada a ser para nós”. A dúvida seria o que fazer com aqueles edifícios abandonados e com um terreno onde apenas existia mato.
“Não sei se o meu pai já lhe contou”, diz-me Helena Sofia Herdadinha, “mas aventurou-se a comprar este terreno, meteu-se a covid-19 e nessa altura parece que as pessoas não pensavam… olha, vamos a isso. Comprámos e ficámos à espera de encontrar alguma empresa ou trabalhadores para podermos arrancar com a obra”.
Como nem empresa nem trabalhadores apareceram, Rui Herdadinha viu-se forçado a recorrer a contactos pessoais e profissionais para resolver o problema. “Teve de se desenrascar, foi à Guiné e trouxe pessoal para trabalhar com a gente. Com a gente mesmo. Vínhamos para aqui do nascer ao pôr do sol até isto estar concluído”. Como, já se viu, “não há acasos”, e dessa ida à Guiné resultou também a criação de uma empresa de construção, mas isso são contas de outro rosário.
Para o que aqui nos trás, o terreno foi limpo, os edifícios acabados, a piscina construída. E Helena Herdadinha, fisiologista clínica com duas cédulas profissionais, também intermediária de crédito e consultora na imobiliária do pai, tomou-lhe o gosto. “Isto é um part-time que me ocupa o tempo todo”.
Passo a passo, o mundo visto da tal janela começou a modificar-se, no edifício principal estão agora instaladas quatro suites e há mais dez habitações que podem ser alugadas. O espaço tomou o nome da família e é como que uma pequena aldeia, “com o conforto de um hotel de cinco estrelas”.
É Helena quem assume toda a logística. “O potencial é muito, as ideias e projetos são muitos, mas estamos a dar um passo de cada vez. O primeiro foi iniciar a exploração turística de curto prazo, oferecendo às pessoas a possibilidade de estarem num ponto central da região a partir da qual podem conhecer toda a envolvência e fazer diversas atividades. Vamos começar já com as provas de vinhos, em parceria com os nossos vizinhos da Mainova”, sublinha.
A ideia, acrescenta, é “manter as portas sempre abertas” a parcerias com os agentes económicos locais, tendo em conta que se trata de uma região “pouco explorada a nível turístico”, apesar de ter “um enorme potencial” para atrair visitantes.
Nem que seja apenas para uns dias de descanso, com passeios por caminhos e trilhos ou mergulhos na piscina ou na fonte, construída frente às moradias e inspirada na Fonte da Pedra, um dos monumentos icónicos de Arraiolos, também conhecida como Fonte dos Almocreves, mandada construir em 1827, sabe-se lá se por alguém que um dia espreitou a uma janela e por ali deixou ficar o olhar.
