A opinião de Breno Teixeira: “Parlamentarismo halloweenesco”

Artigo de opinião de Breno Teixeira, cronista

A política portuguesa atual é, sem dúvida, uma festa de Halloween que se estendeu para lá de 31 de outubro. Os corredores da Assembleia da República parecem um salão decorado com teias de aranha legislativas e esqueletos de promessas antigas. Os partidos desfilam em fantasias cada vez mais criativas, tentando convencer o eleitorado de que são a solução, quando muitas vezes são apenas parte do enigma.

Os vampiros do sistema continuam a sugar recursos públicos com uma elegância digna de conde da Transilvânia. Aparecem em debates televisivos com sorrisos afiados e discursos que brilham à luz das câmaras, mas que se desfazem ao primeiro contacto com a realidade. São alérgicos à transparência e têm uma aversão profunda a cruzes — especialmente aquelas feitas com gráficos do Tribunal de Contas ou relatórios da OCDE.

Já os fantasmas da democracia pairam pelos corredores ministeriais, sussurrando palavras como “reforma”, “transparência” e “participação cidadã”. Ninguém os vê, mas todos juram que ainda existem. São invocados em campanhas eleitorais e desaparecem misteriosamente após a tomada de posse. A sua presença é mais simbólica do que efetiva, como aquele fantasma decorativo pendurado na varanda de um prédio em Lisboa: está lá, mas ninguém lhe liga.

Os zumbis ideológicos também marcam presença. São partidos que morreram há décadas, mas continuam a andar por aí, repetindo slogans de outros tempos como se fossem revelações fresquinhas. Não pensam, não evoluem, mas têm uma fome insaciável por tempo de antena. Caminham em linha reta, ignorando os sinais de mudança, e tropeçam em realidades que já não compreendem. São fáceis de identificar: basta ouvir frases como “resgatar os valores de Abril” ou “voltar ao Portugal de antigamente”, geralmente sem explicar como, nem porquê.

No meio da confusão, os magos da retórica fazem truques com palavras. Transformam escândalos em mal-entendidos, cortes em “revisões orçamentais” e crises em “momentos de transição”. Com um simples “não é bem assim”, fazem desaparecer perguntas inconvenientes. Os seus feitiços favoritos são “contextualização”, “narrativa” e “interpretação política”. E quando tudo falha, invocam o demónio favorito: “a culpa é da comunicação social”.

A diplomacia portuguesa, por sua vez, parece uma sala cheia de aranhas, tecendo acordos com fios tão finos que se desfazem ao primeiro tweet de um ministro estrangeiro. Reuniões entre países lembram bailes de máscaras, onde todos fingem ser amigos enquanto escondem divergências atrás das costas. A União Europeia virou uma espécie de casa assombrada: todos entram, poucos escutam, e ninguém sabe quem realmente manda.

Os eleitores, coitados, são como crianças inocentes (ou nem tanto) que batem à porta dos políticos pedindo doces: saúde, educação, justiça. Recebem promessas embaladas em papel brilhante, mas ao abrir… surpresa! É um brócolis legislativo, uma taxa inesperada ou uma medida provisória que se torna permanente. Alguns aprendem e deixam de bater à porta. Outros voltam, fantasiados de esperança.

E como não podia faltar, há os vilões de ocasião, que ameaçam com moções de censura como quem brinca com petardos, e os super-heróis de redes sociais, que salvam o país com selfies e hashtags, enquanto o orçamento se arrasta em fundo desfocado. A política virou um desfile de fantasias: quanto mais chamativa, mais likes. E no fim, quem não tem filtro, não tem futuro.

No grande Halloween lusitano, o susto é diário, os doces são escassos e as travessuras são feitas com decretos. E enquanto o país dança entre o terror e a comédia, resta-nos escolher bem a fantasia e, quem sabe, começar a exigir que os monstros voltem para os contos de ficção.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Partilhar artigo:

ASSINE AQUI A SUA REVISTA

Opinião

CARLOS LEITÃO
Crónicas

BRUNO HORTA SOARES
É p'ra hoje ou p'ra amanhã

Caro? O azeite?

PUBLICIDADE

© 2025 Alentejo Ilustrado. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por WebTech.

Assinar revista

Apoie o jornalismo independente. Assine a Alentejo Ilustrado durante um ano, por 30,00 euros (IVA e portes incluídos)

Pesquisar artigo

Procurar