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Carlos Cupeto (opinião): “Alentejo_27”

Carlos Cupeto, professor da Universidade de Évora

Há 14 meses tivemos a boa noticia que Évora seria Capital Europeia da Cultura em 2027. A este propósito, muito recentemente, ouvi José Santos, presidente do Turismo do Alentejo (provavelmente a pessoa mais qualificada para a função que exerce), dizer que em 27, no dia de abertura, se esperam um milhão de pessoas em Évora. Mesmo que sejam metade serão mais que a totalidade da população do Alentejo, um absurdo. Mas disse mais, que em 2026 a cidade irá já ter um número de turistas, dos mercados que nos interessam, nunca visto. Esta “dos mercados que nos interessam” fica para outro escrito. 

O que acabaram de ler é uma contingência única, qualquer coisa semelhante à queda de um enorme meteorito no Alentejo. Nos últimos 2000 anos da história de Évora não há nada que se lhe possa comparar. Talvez só a chamada “época de ouro”, o tempo em que a Corte se instalou na cidade, possa ter algum paralelo. O mais preocupante é que o tempo passa e ainda nada aconteceu. 

Não sou, nunca fui e não serei velho do Restelo, mas o marasmo em que Évora e, no geral, o Alentejo caíram tem um custo demasiado grande para que a oportunidade de 27 não seja totalmente aproveitada e potenciada. Este marasmo não é de hoje, tem décadas e tem nome, chama-se pobreza, despovoamento e degradação. Obviamente que os governantes locais são os principais responsáveis, é para isso que se candidatam e são eleitos. 

O desafio não é de Évora, é do Alentejo. A qualificação e valorização que se exigem não é só do território, é também dos diferentes sectores socioeconómicos e culturais. Cada parte tem muito a fazer e essa responsabilidade é de cada um individual e coletivamente. O Alentejo, o vinho, a olaria, a cortiça, o azeite, a açorda, o cante, os bonecos de Santo Aleixo, os capotes, etc., vão ter um palco como nunca tiverem e não voltarão a ter. É igualmente preciso coragem para assumir que igrejas e castelos a Europa tem muito melhor que nós e só vem, a finisterra, quem já viu tudo o resto. Choca? Paciência, é verdade. 

No dia em que Évora ganhou o título, Paula Mota Garcia, coordenadora da candidatura de Évora_27, referiu-se a “ressignificar”, não só Évora, mas o Alentejo. “Ressignificar” tem um sentido profundo, quase, de revolução. Na mesma ocasião, Ana Luena, da associação Malvada, sublinhou: “É tempo de nos cumprirmos a nós”. 

Estou totalmente de acordo, temos vivido um tempo de inação, de deixar passar as oportunidades, de apostas erradas que nos conduziram ao que Évora e o Alentejo são hoje, uma cidade e uma região que estão por cumprir. Depois de 50 anos de ditadura fascista, estamos há 50 anos limitados por uma ideologia que não sabe e não pode criar riqueza porque se o fizer perde o poder. 

Évora e o Alentejo chegaram a um ponto inaceitável que exige melhor governança, sobretudo outros caminhos, outras apostas que transformem os nossos recursos numa terra de bem-estar onde valha a pena viver, não só para alguns. Grande verdade disse a diretora da Malvada, “é tempo de nos cumprimos”. Obviamente que esta afirmação não é por acaso, cada um de nós, que cá vive, tem uma parte de responsabilidade no fracasso a que chegámos.

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