Camilo Mortágua (1934/2024). “Morreu um lutador contra a ditadura”

Combatente antifascista, Camilo Mortágua morreu aos 90 anos. O seu funeral realiza-se esta manhã de sábado, em Alvito, onde residia à longos anos. O Presidente da República recorda-o como "um lutador contra a ditadura".

A notícia da morte de Camilo Mortágua foi avançada pela família. “Partilhamos com os muito amigos e companheiros que se cruzaram com o Camilo a alegria de termos testemunhado uma vida de convicções, de compromisso com a liberdade e com a solidariedade”, escreveu Mariana Mortágua na sua página de Facebook. 

À coordenadora do Bloco de Esquerda e à sua irmã, a também deputada Joana Mortágua, o Presidente da República enviou uma mensagem de condolências. “[Camilo Mortágua foi um] lutador contra a ditadura durante muitas décadas do século passado e deixou-nos ao fim de uma longa e multifacetada vida ao serviço dos ideais que abraçava”, sublinhou Marcelo Rebelo de Sousa.

Nascido a 29 de janeiro de 1934 em Oliveira de Azeméis, Camilo Tavares Mortágua foi um militante português que lutou contra a ditadura do Estado Novo, tendo militado na Liga de Unidade e Acção Revolucionária (LUAR). Em junho de 2005, foi condecorado pelo Presidente da República, Jorge Sampaioi, com o grau de Grande Oficial da Ordem da Liberdade da República Portuguesa.

“Camilo Mortágua”, assinala o dirigente socialista João Soares, “era o ultimo sobrevivente dos corajosos e audazes militantes anti-salazaristas que com o comandante Henrique Galvão fizeram a histórica tomada do paquete Santa Maria. Que transformaram em Santa Liberdade. Foi um dos que também ligados a Galvão desviaram o avião da TAP Casablanca Lisboa. Fez parte do grupo do assalto à agência do Banco de Portugal na Figueira Foz”. Assinala João Soares que o país perdeu “um homem digno, honrado, um grande combatente da Liberdade”.

Uma das suas principais ações contra o regime salazarista foi a “Operação Dulcineia”, iniciada na madrugada de 22 de janeiro de 1961, sob o comando do capitão Henrique Galvão, na qual foi tomado de assalto o paquete Santa Maria, que transportava cerca de 600 turistas para Miami e mais de 300 tripulantes, numa ação que chamou a atenção internacional para o regime liberado por Oliveira Salazar.

Nesse mesmo ano, em novembro, com Palma Inácio, desvia um avião da TAP para lançar mais de 100 mil panfletos contra a ditadura em diversas cidades, como Lisboa, Beja e Faro. Seis anos depois, integra um grupo que assalta a filial do Banco de Portugal na Figueira da Foz, ação que está na origem na constituição da Liga de Unidade e Ação Revolucionária (LUAR)

Em 2019, o “El Pais” definiu-o como “o homem que desviou um transatlântico, sequestrou um avião e assaltou um banco sem disparar um tiro”. Em entrevista ao jornal espanhol resumiu a sua forma de encarar a vida: “Para um combatente da liberdade, não há nada pior que a passividade e o adiamento constante de novas ações”.

O músico Sérgio Godinho destaca uma “longa história de amizade e de trabalho conjunto”, sobretudo aquando da sua primeira digressão, intitulada “Sete Anos de Canções”, “criada por ele para dar boas condições de trabalho aos músicos – a começar pelo Zeca Afonso, que se queixava das condições precárias em que cantava, e ao mesmo tempo não deixava de acudir a todos os fogos, e à borla”.

“O Camilo era isto, um organizador, um agregador, um inventor de projectos e de conceitos. Fez isso toda a vida, e nisso, não havia igual”, refere Sérgio Godinho.

Já o embaixador Seixas da Costa define-o como um “valente lutador contra a ditadura” e recorda as ações em que participou. “Só uma ditadura que foi culpada por imensos mortos, por uma criminosa guerra colonial, por décadas de perseguições, torturas e prisões que arrasta no seu inapagável cadastro histórico, com a PIDE e a censura cobardemente a seu lado como mão executora, teve o desplante de qualificar como crimes comuns alguns atos justamente praticados, como hoje está mais do que provado, para enfraquecer o regime que iria cair de podre e de ridículo perante a história”, refere Seixas da Costa.

No Alentejo, onde se radicou depois do 25 de Abril, esteve ligado a diversos projetos de desenvolvimento regional. Em 1991 fundou nas Alcáçovas a Associação Terras Dentro.

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