Joana Villaverde esteve pela primeira no Médio Oriente, em 2014, numa residência artística patrocinada pela Fundação Qattan, em Ramallah. Um ano depois regressou, a convite da European Union National Institutes for Culture, para o ‘workshop’ Rethink Palestine, em Jericó e, no final do mesmo ano (2015), de novo em Ramallah, participou num outro ‘workshop’ intitulado “Walter Benjamin in Palestine”.
Por estes dias, a guerra na Faixa de Gaza não deixa ninguém indiferente. São horas seguidas de imagens, notícias e comentários sobre um conflito que dura há mais de 70 anos e que – depois de um atentado do Hamas em território israelita que provocou 1700 mortos e 300 reféns – culminou com a invasão pelo exército de Israel daquele enclave. Uma invasão que, em cerca de três meses, provocou mais de 25 mil mortos do lado palestiniano, sobretudo mulheres e crianças.
“É uma sensação de impotência muito grande estar aqui e não poder fazer nada”, diz Joana Villaverde. “Sinto vontade de ir para lá e dá-me uma raiva enorme em relação a tudo. Deixei lá muitos amigos e, portanto, estou em contato com eles. Conheci pessoas em Gaza, mas que já lá não estavam [quando começou esta guerra]. Estão na Cisjordânia, que também está a ser, quer dizer, continua a ser atacada de forma violenta”.
Nada que a artista não conheça em primeira mão. Na sua visita à Palestina, em 2014, assistiu “ao ataque a Gaza” que durou cerca de mês e meio. Na altura, também não teve muita liberdade de movimentos, uma vez que estava a viver como qualquer outro palestiniano, em Ramallah.
No entanto, por ser portuguesa, podia ir a Jerusalém, como faziam os palestinianos com mais de 60 anos para irem rezar uma vez por semana. Para isso tinha de passar pelo famoso ‘check-point’ de Qalandiya, um local que lhe faz lembrar “aquelas baias para vacas e torniquetes, [um local] onde as pessoas são tratadas como bichos. Estão muitas horas naquela fila e depois, às tantas, um miúdo israelita militar diz: ‘ah, esta senhora é de outro país’”…
Como qualquer artista, Joana Villaverde não é imune às suas vivências. Em 2015, montou uma exposição, em Avis e em Lisboa – “Animals’ Nightmare” -, em que gazelas eram protagonistas. “Na Palestina a Árvore da Vida é o símbolo da verdade. Trata-se de um mosaico lindíssimo do ano 800 a.C. que está em Jericó e é feito com mosaicos pequeninos, com uma árvore e um leão a querer apanhar uma gazela, mas ela vai conseguir fugir. Portanto é um símbolo de força, resistência e liberdade que os palestinianos adotaram. Tem o leão e tem a gazela”.
Joana nasceu em Lisboa, mas, há duas décadas a viver no Alentejo, consegue encontrar semelhanças entre as pessoas dos dois territórios: “Há qualquer coisa nas pessoas, uma facilidade no relacionamento tal como com as pessoas daqui, e o que o mais se destaca é o sentido de resistência. São uns resistentes. No Alentejo as pessoas [também] são assim”.
Atualmente, evita ver televisão. “Não consigo mesmo. É tanta mentira descarada que recorro a outras formas de informação”. A curto prazo também não consegue antever uma solução para o problema, mas mantém a “esperança”.
Um amigo seu, um jornalista que se mantém no território, diz-lhe que “perdeu” o foco. “Não consegue pensar. Está sempre em constante sufoco com o horror que vê todos os dias. É muito deprimente, mas o que está a acontecer é um genocídio em direto, é a normalização do horror, a banalização do mal. Quando paro e penso no que se está a passar choro”, desabafa.
No seu espaço de trabalho, que também é um local aberto à comunidade, tem procurado contribuir para o desenvolvimento cultural do concelho e da região, nomeadamente, divulgando a arte contemporânea nas suas várias vertentes. Conversas, debates, exposições, projeção de filmes, ‘workshops’ para miúdos e idosos, de tudo um pouco se tem feito naquele espaço de forma “a aproximar o público das artes e desmistificar a suposta complexidade associada à arte contemporânea, aos artistas e ao processo criativo”.
A Officina Mundi é um atelier propriedade da Câmara de Avis, cedido com base num protocolo de colaboração, no centro histórico da vila. Tem dois andares. O piso térreo é palco para a realização das diversas atividades; em cima existem duas salas de trabalho e um pequeno quarto que se destina a acolher convidados. É o que irá acontecer em breve para uma residência artística de um jovem artista palestiniano. É caso para dizer que a luta continua.