Concluídas as eleições do ano passado, o matemático Henrique Oliveira dedicou-se a estudar os resultados, concluindo que quase 1,3 milhões de votos não serviram para eleger qualquer deputado, o que representou cerca de 20,4% do total de votos, numa realidade que afeta sobretudo os círculos de emigração e os territórios do interior. A começar por Portalegre, onde “quase metade dos votos não servem para eleger deputados”.
Henrique Oliveira constata a existência de uma “grande desigualdade territorial”, pois, na prática, o voto de quem vive no interior do país “vale menos” que o voto no litoral – em Lisboa, conclui o estudo, cerca de 90% dos votos são convertidos na eleição de deputados.
A explicação para mais esta descriminação negativa dos territórios de baixa densidade está na aplicação do método d’Hondt a regiões com pouca representação parlamentar. E o círculo de Portalegre, ao eleger apenas dois deputados, é o mais pequeno do país. Nas legislativas de 2022, o PS elegeu os dois (Ricardo Pinheiro e Eduardo Alves), tendo obtido 47,21%, seguido do PSD com 23,23%. Já nas eleições do ano passado, a “queda” eleitoral dos socialistas aliada à subida de votação do Chega, fez com que estes dois partidos dividissem a representação parlamentar.
Num distrito que, tradicionalmente, vota PS nas legislativas, os socialistas apresentam-se a votos com a convicção da “eleição segura” do cabeça-de-lista, o advogado e ex-deputado Luís Moreira Testa. As atenções estarão, sobretudo, centradas na eleição do segundo deputado e por dois motivos. O primeiro é que em 2024 a diferença entre Chega e AD foi de apenas 783 votos (1,29%). Depois, porque o PSD “aposta forte” na conquista de representação parlamentar por Portalegre, ao candidatar o atual ministro das Coesão Territorial Manuel Castro Almeida, enquanto o Chega muda o cabeça-de-lista.
O ano passado, o partido de André Ventura apresentou-se a votos com uma lista liderada pelo ex-secretário de Estado do PSD Henrique Freitas, agora excluído e substituído pelo gestor João Lopes Aleixo. Acresce que a saída de Henrique Freitas não foi pacífica, tendo o próprio confessado sentir uma “enorme desilusão” e antecipado a “destruição eleitoral” do partido no distrito.
Entre os partidos com representação parlamentar, os cabeças-de-lista às eleições de dia 18 são Helena Neves (CDU), antiga coordenadora da União de Sindicatos do Norte Alentejano, o bancário aposentado José Carita Monteiro (Bloco de Esquerda), o auditor de serviços financeiros Francisco Biscaya Cardoso (Iniciativa Liberal) e João Ramos (Livre), doutorando em Ciência Políticas. Finalmen- te, o PAN candidata a professora Telma Espírito Santo.
SEM SURPRESAS À VISTA
Presença habitual nas televisões entre 2013 e 2022, período durante o qual presidiu ao grupo parlamentar do PCP, João Oliveira foi a aposta da CDU para Évora nas legislativas de 2022. Nem a projeção mediática, nem o facto de jogar “em casa” lhe valeram, uma vez que a coligação não conseguiu eleger qualquer deputado, facto inédito desde o 25 de Abril. Nas eleições seguintes, já com Alma Rivera em cabeça-de-lista, a CDU perdeu mais 1700 votos e foi ultrapassada pelo Chega.
À partida para estas legislativas, a representação parlamentar pelo círculo de Évora está dividida por PS, o partido mais votado nas últimas três décadas, PSD e Chega, sendo que o partido de André Ventura, em 2024, arrecadou mais oito mil votos que os comunistas.
Aqui chegados, apenas os socialistas mantêm o cabeça-de-lista: Luís Dias, deputado, presidente da Federação Distrital de Évora do PS e ex-presidente da Câmara de Vendas Novas. A lista do PSD é, desta vez, liderada por Francisco Figueira, presidente da distrital social-democrata e chefe de gabinete do Grupo Parlamentar do PSD, que substitui Sónia Ramos. Também o Chega optou por mudar de cabeça-de-lista, trocando Rui Cristina, agora candidato em Beja, por Jorge Galveias, parlamentar eleito por Aveiro nas anteriores eleições.
Num distrito onde, à partida, não se anteveem alterações significativas no que à representação parlamentar diz respeito, a CDU volta a mudar de candidato, apostando agora na professora Maria da Graça Nascimento, de 51 anos, residente em Montemor-o-Novo, com perfil substancialmente diferente dos anteriores candidatos, muito menos mediatizada, ainda que integrando o Comité Central do PCP e dirigente do Sindicato dos Professores da Zona Sul.
“No caso do PS”, diz fonte da distrital socialista, “estas eleições permitirão aferir a vitalidade do partido para as próximas autárquicas, onde a fasquia estará mais elevada, com combates acesos em diversos municípios, incluindo a capital de distrito, e com a liderança da Comunidade Intermunicipal em aberto”. A mesma fonte aponta as eleições de 18 de maio como o momento da “consumação da regeneração” etária no PS/Évora, sendo a primeira vez nas últimas décadas em que nomes “históricos” como Capoulas Santos, Carlos Zorrinho ou Noberto Patinho não se apresentam a votos.
Quanto aos restantes partidos com assento parlamentar, a lista do Bloco de Esquerda será liderada pelo especialista em sistemas e tecnologias de informação Pedro Ferreira, enquanto a Iniciativa Liberal apresenta o estudante universitário Rodrigo Mendonça. O Livre repete a candidatura da educadora de infância Glória Franco, que vive em Montemor-o-Novo, e o PAN faz o mesmo com o analista de dados Sérgio Neves, residente em Lisboa.
REGRESSO DIFÍCIL PARA A CDU
Se a possibilidade de a CDU recuperar o deputado por Évora se afigura difícil, em Beja não o será menos. Os comunistas apresentam-se a votos com uma lista liderada por Bernardino Soares, antigo deputado e presidente da Câmara de Loures entre 2013 e 2021. Comentador televisivo, e várias vezes referido como “putativo candidato” à liderança do PCP, Bernardino Soares até teve direito nestes dias a entrevistas na RTP e no “Expresso” – “cá estou, não era altura de calçar as pantufas” – o que não sucedeu com qualquer outro candidato, mas que a sua notoriedade nacional ajuda a explicar.
Ainda assim, em 2024, a diferença entre a CDU, quarta força mais votada, e a Aliança Democrática, a terceira, foi significativa: 1320 votos. A que acresce o facto de os comunistas terem perdido, nos últimos 10 anos, cerca de 38% da sua base eleitoral. Com a perda do deputado por Beja nas eleições do ano passado, o PCP ficou na situação inédita desde o 25 de Abril de não ter representação parlamentar pelo Alentejo
Entre os socialistas, tradicionalmente o partido mais votado tanto em legislativas como nas autárquicas, a convicção é que, pelo menos, o cabeça-de-lista será eleito. Antigo deputado e ex-presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura, Pedro do Carmo volta a liderar a candidatura do PS no Baixo Alentejo, substituindo Nelson Brito, presidente da Federação socialista, e próximo candidato à presidência da Câmara de Aljustrel. Também no Chega haverá mudança de protagonista.
A ainda deputada Diva Ribeiro, que prometia há um ano ser “a voz que o distrito de Beja não tem tido”, e que ficou conhecida por ser acusada de insultar uma deputada invisual, deu lugar a Rui Cristina, eleito deputado por Évora nas legislativas de 2024, após ter sido deputado do PSD por Faro. A Aliança Democrática mantém a aposta em Gonçalo Valente, licenciado em Agronomia e vereador sem pelouros na Câmara de Ourique, que há um ano conseguiu recuperar a representação parlamentar do PSD por Beja – a última vez que isso sucedera fora em 2015 numa lista liderada por Nilza Sena.
Entre os restantes partidos com representação parlamentar, são cabeças de lista por Beja: o professor aposentado Alberto Matos (pelo Bloco de Esquerda); a coordenadora técnico-pedagógica Generosa Brito (Iniciativa Liberal); o médico Luís Coentro (PAN) e o estudante de doutoramento Fausto Camacho Fialho (Livre).