Com texto e encenação de Pedro Saavedra, “Adrianopla” leva-nos ao encontro da gravação de um documentário algures no final do século XX no interior dos Alpes austríacos, onde se instalou uma comunidade apostada em construir um novo tipo de sociedade, baseada na igualdade. Para este grupo de utópicos, ninguém pode ter propriedade sobre coisa nenhuma, o dinheiro é proibido, a monogamia foi abolida e os filhos, que por lá nascem, têm paternidade coletiva.
O problema é que a experiência de tentar manter a ordem social e a epopeia da comunidade choca de frente com os constantes subornos que são oferecidos ao líder e os crescentes conflitos individuais que este tenta resolver. Será então esse o verdadeiro documentário sobre Adrianopla.
“Da história das comunas hippies dos anos 70”, assinala Pedro Saavedra no testo de enquadramento da peça, “resta-nos a amargura do projeto falhado: uma utopia anarquista para um mundo diferente”. Este projeto ficcional, acrescenta, retorna a essa década do século XX, em que diversas pessoas, “juntas sob um projeto comum, como nas comunidades de inspiração Baptista e Quaker dos Estados Unidos da América”, trabalham “num sonho em conjunto, numa tabula rasa comunal, numa autodefinição de si mesmos, livres de propriedade e de dinheiro. Se ninguém possuir nada, nada será cobiçado”.
Na peça, este “idílico regresso ao éden” é filmado por uma equipa documental, “sob a liderança de uma realizadora ambiciosa, com um olhar jornalístico, responsável por descobrir o que se passa realmente” naquela comunidade, “se funciona, e nos oferece um modelo revolucionário para viver as nossas vidas, ou se esconde dúvidas sinistras, insanáveis sobre a condição humana”.
Ainda de acordo com a mesma fonte, “esta tensa disposição”, entre a realizadora e a sua equipa de filmagens, e a comunidade e o seu líder, “enigmático, transgressor, a única ligação de Adrianopla com o mundo exterior e disposto a esconder, negociar e mentir para salvaguardar essa condição, é mediada por uma terceira ameaça, sobrevoando oculta sobre todos: a de uma escavação arqueológica ilegal nos terrenos da comuna, destapando ruínas ligadas aos verdadeiros pilares do início da cristandade”.
O texto e encenação é de Pedro Saavedra, as interpretações são de Paula Garcia, Rafael Barreto e Wagner Borges e a cenografia de Joaquim Santos.