Jorge Araújo: “O bom exemplo dos telhados de vidro”

A opinião de Jorge Araújo, professor emérito da Universidade de Évora

Os Condes de Sortelha foram os expoentes de uma família conservadora que viveu “à grande e à francesa” graças à proximidade à Coroa, a casamentos vantajosos, a rendas feudais e, naturalmente, ao sistema de morgadio. Que se saiba, não terão contribuído para a grandeza da pátria, nem se lhes conhecem obras valorosas, artísticas ou literárias, nem científicas ou filosóficas, daquelas que libertam os homens da lei da morte.

D. Luís da Silveira foi agraciado com o título de Conde de Sortelha em 1527 por D. João III, e chegou a ser seu Mordomo-mor, o mesmo é dizer “Chefe da Casa Real” e “Gestor Logístico e Financeiro da Corte”; o equivalente a Lord Chamberlain na corte inglesa… não era coisa pouca!

Não nos admiremos, pois, que tenha saído da sua aldeia de Sortelha para se instalar em Évora. Procurou um dos pontos mais altos da cidade e aí construiu a sua modesta morada, um palácio em típica arquitetura renascentista. A proximidade com o Paço Real de Évora e com a Sé testemunha a importância social do seu proprietário.

O título de conde terá tido três réplicas, antes de se perder pela aleatória distribuição dos cromossomas x e y.

No século XIX, mais precisamente em 1867, o edifício manuelino da Praça do Giraldo onde estava instalado o governo da cidade – os Paços do Concelho – foi demolido para dar lugar ao modernaço Banco de Portugal. Com a promessa de que ficaria melhor servida, a Câmara arrumou os tarecos e foi-se instalar algures, a título provisório. Esperou 34 anos até o Palácio ter sido comprado em sua intenção. Dez anos depois…, já a República ditava as leis, concluíram-se as obras de reconversão do Palácio, e a Câmara pôde, finalmente, instalar-se com a dignidade que lhe é devida.

Este episódio não pode senão confortar-nos quanto à normalidade do vagar das decisões e das obras, em Évora. O que interessa é que o Palácio dos Condes de Sortelha, neste ínterim, sofreu profundas remodelações, com a introdução de estruturas de ferro e vidro, inspiradas, digo eu, na Galeria Vittorio Emanuele, em Milão e no Palácio de Cristal de Londres, da época.

Foi assim rasgado o telhado e instalada uma cúpula em vidro. A transparência e a claridade eram uma forma de mostrar o progresso técnico associado à clareza da governação, e enfatizar a transição de um espaço de elite, fechado, para um espaço público, aberto; tenhamos presente que, desde a constituição de 1838, o liberalismo caldeado com os ideais democráticos, rejuvenescia a monarquia.

O Palácio dos Condes de Sortelha consubstancia, assim, nas suas estruturas de ferro e vidro, um exemplo daquilo de que Évora mais precisa: arrojo!

O atual Executivo camarário lançou também uma obra arrojada que ficará na história do nobre edifício, e de Évora também: a substituição dos vidros da cobertura por telhas de vidro fotovoltaicas, que permitirão manter a claridade, mitigar as despesas energéticas e dar exemplo ao povo de como é possível e desejável não delegar nos fundos financeiros a transição energética do país. Parabéns à Câmara Municipal pelo arrojo.

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