Lurdes Nobre (opinião): “Évora 27, passo a passo”

Lurdes Nobre, promotora cultural

“Évora 27 Passo a Passo” é um ciclo de encontros regulares entre a equipa Évora_27 e a sociedade civil.  O primeiro encontro com o setor cultural decorreu no Convento dos Remédios. As estruturas e artistas do Alentejo ficaram a saber algumas das linhas da programação, já definida em 70% no documento de candidatura, e como poderemos participar. As convocatórias para apresentação de projetos, muito em moda nos dias de hoje, vão começar a ser lançadas no segundo semestre de 2024. Umas dirigidas aos agentes do território, outras para agentes que tenham ligações com outros países da Europa e do Mundo e claro, uma só para projetos vindos de fora, já que esta é uma Capital Europeia da Cultura.

Apesar de pessoalmente detestar as “call”, porque excluem muitas estruturas que não têm como fazer candidaturas, sempre complexas, com objetivos estratégicos e orçamentos, percebo as opções da equipa, e fiquei muito agradada com uma das decisões tomada. A de que só poderá candidatar-se à chamada de criadores do Alentejo, quem já vem desenvolvendo o seu trabalho artístico na região. Foi uma decisão importante pois, caso contrário, viriam instalar-se todos aqueles que, vindos de Lisboa ou outras exteriores paragens, andam de terra em terra a sugar os dinheiros públicos da cultura e que, logo que esgotados, mudam de rumo.

No entanto, acho pouco dinheiro. Muito pouco para todos os projetos artísticos, de 30% da candidatura. O Alentejo é um terço do território, temos centenas de estruturas artísticas, de artesãos, de grupos de cante, de narradores orais, como podemos aceitar que apenas 54 propostas sejam apoiadas? Sim, porque o apoio de três milhões de euros será para as 54 candidaturas que o júri achar mais interessantes. E os critérios dos júris, são sempre subjetivos.

Segundo percebi, para dividir entre as intervenções dos agentes locais, as de novos públicos e as internacionais em colaboração com agentes da região, disponibilizam-se cerca de 10 milhões de euros. Depreendo assim que todo o restante investimento esteja comprometido e esgotado com os tais 70%, já inscrito na candidatura.

A ideia de ligação entre estruturas do setor, tónica sempre dada nas intervenções da equipa de missão, não a consigo vislumbrar, nestas “calls”.  Nem me pareceu pelas intervenções escutadas que seja pauta entre as estruturas. Aliás, o que ficou presente é que a ideia de “divisão de dinheiros” de forma matemática é feita por muitas delas. O que faz sentido se nos centrarmos só na nossa própria estrutura, no nosso próprio projeto. Aí o que importa é o que nos calhará, individualmente, mas e o todo? O Alentejo? E os outros que também fazem trabalho artístico no território? Eis uma visão economicista, que me abala. Posso estar enganada, mas não nos dá a ideia de existir um futuro para lá de 2027. O que me deixou, como se diz no Alentejo, “cabreira”. Sendo eu uma das mais velhas presentes na sala, gostaria de ter escutado o setor, preocupado com o “para lá de”, como fazer para que permaneça a massa critica, os novos públicos e os novos criadores no Alentejo, depois da Capital Europeia da Cultura.

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