Mais alunos, mais financiamento. O Politécnico virou a página

Nos últimos seis anos, o Instituto Politécnico de Portalegre aumentou em mais de 60% o número de alunos e soma mais de 30 milhões de euros em projetos de investigação. Um dos obreiros da “revolução” é Luís Loures, um baixo-alentejano nascido no Algarve, que assumiu a presidência em 2021.

Luís Godinho (texto) e Cabrita Nascimento (fotografia)

Em 2017, lembra Luís Loures, o Instituto Politécnico de Portalegre (IPP) não tinha mais de 1800 alunos. Seis anos depois chegam quase aos três mil, sendo que 70% são oriundos de outras regiões, que não o Alentejo. Porventura ainda mais expressiva é a evolução do investimento que o IPP tem conseguido alavancar para projetos de investigação aplicada, que passou de 1,6 para 33 milhões de euros.

A realidade de 2017, lembra o atual presidente da instituição, estava ainda condicionada por “uma crise económica muito significativa, que reduziu a capacidade financeira das famílias e a mobilidade dos alunos”, o que penalizou os estabelecimentos de ensino superior mais afastados das grandes áreas urbanas. “Houve uma contração da procura a nível nacional, mais sentida em regiões com menor depressão demográfica, como a nossa. Depois, a notícia da existência de menos alunos contribuiu para reduzir ainda mais a procura”.

É nesse ano que o ciclo se começa a inverter, em resultado do crescimento da atividade económica, mas também da aposta numa “comunicação diferenciada” já que “não basta fazer as coisas bem feitas”, é preciso que a comunidade o reconheça. “Por outro lado”, sublinha Luís Loures, “apostámos muito numa capacitação em termos de investigação, inovação e desenvolvimento que resultou num crescimento exponencial do ponto de vista da investigação, o que contribuiu muito para garantir a sustentabilidade financeira do Politécnico e para dar visibilidade ao nosso trabalho e à capacidade instalada”.

Em resumo: “A qualidade e a excelência do ensino nunca estiveram em causa, mas é preciso que os alunos sintam isso e que, quando vão para o mercado de trabalho, sejam reconhecidos porque a instituição onde fizeram a sua formação também é reconhecida”.

Por essa altura, em 2017, Luís Loures era vice-presidente do IPP, então presidido por Albano Silva. Recorda que a instituições começou a ganhar projetos internacionais, no âmbito do Horizonte 20/20, um programa comunitário para a investigação e inovação. “Nos primeiros três anos passámos de um investimento inicial em investigação de 1,6 para mais de 10 milhões de euros e continuámos sempre a crescer. Isso deu-nos um reconhecimento nacional e internacional que ajudou a tudo o resto”. Por resto entenda-se não só o crescimento do número de alunos, mas também os resultados. “Se calhar, em 2014/15 tínhamos dos piores resultados ao nível das colocações no concurso nacional de acesso. Agora somos das instituições do interior com melhores resultados. É assim como a dinâmica do futebol, se for de vitória os golos acabam por acontecer”.

Já por aqui se disse que cerca de 70% dos alunos do IPP são oriundos de outras regiões do país, que não o Alentejo. O problema é que a região, como todo o interior, “tem uma capacidade de fixação de talento relativamente reduzida, e também tem uma capacidade de atração de talento relativamente reduzida”. O resultado é o despovoamento. “São dois fatores críticos para o crescimento e afirmação de qualquer região”, sublinha o presidente do Politécnico, referindo que vários estudos provam que “em cada 10 jovens que vão estudar para uma grande cidade, como Lisboa ou Porto, só dois acabam por regressar” ao território onde residiam. “É que essas grandes cidades, para além de terem uma capacidade de oferta de emprego muito superior, têm a oferta de um conjunto de serviços, até na saúde, serviços culturais… que chega a ser difícil de comparar”. 

Para tornar o interior, “que tem uma qualidade de vida extraordinária”, mais atrativo para os jovens, há que contar com fatores que dependem de uma estratégia regional ou local, como a habitação, mas também com um conjunto de fatores exógenos, “sobre os quais nada podemos fazer”, que condicionam a decisão de uma família se instalar, por exemplo, em Portalegre, em vez de o fazer no litoral. 

Veja-se o caso da saúde. “Temos o Serviço Público de Saúde, mas não há oferta privada. As pessoas têm seguro de saúde ou ADSE, mas quando não se consegue resposta no SNS é preciso ir a Lisboa ou a Évora, gastar muito mais dinheiro e perder um dia de trabalho para ter acesso a uma consulta de especialidade”.

Quanto ao que a região pode fazer, Luís Loures lembra, por exemplo, que em Lisboa “um estudante não paga transportes públicos, mas em Portalegre tem de pagar 50% do preço do bilhete”, ou o problema do alojamento dos estudantes do ensino superior. O Politécnico a que preside tem um ‘campus’ de três hectares onde poderia ser construída uma residência de estudantes, mas a Câmara decidiu fazê-la no centro da cidade, pois terá um “impacto diferenciador e positivo” na dinamização da cidade e até no comércio. 

“O problema”, sublinha o presidente do IPP, “é que debatemos com o Município há sete ano, não é há sete meses, é há sete anos, a criação de uma ciclovia que ligue a cidade ao ‘campus’ e isso ainda não foi feito. É um pequeno exemplo de medidas que só dependem da nossa boa vontade”. 

Para o Politécnico de Portalegre não se trata de um problema menor. O preço da habitação “disparou”, tornando mais difícil encontrar soluções de arrendamento para os estudantes universitários. “O ano passado, só na primeira fase do concurso de acesso, perdemos cerca de 50 alunos pela falta de habitação. Uma cidade como Portalegre não se pode dar a esse luxo. Estes alunos são fundamentais para o desenvolvimento das regiões”, lamenta Luís Loures, garantindo que o problema, a médio prazo, ficará “minimizado”, sendo a rede de residências ampliada em quase 200 camas através de projetos financiados pelo Plano de Recuperação e Resiliência, num investimento global de 8,3 milhões de euros. Em Elvas, o Município está a concluir uma nova residência, que permitirá o alojamento de 80 estudantes.

ALGARVIO “POR FATALIDADE”

Duplamente licenciado pela Universidade do Algarve, em Arquitetura Paisagista e em Agronomia, doutorado em Planeamento, com uma parte significativa do seu trabalho de investigação feito nas Universidades de Michigan (Estados Unidos) e Toronto (Canadá), Luís Loures nasceu em Faro, em março de 1982. Algarvio por “fatalidade”, diz-lhe o pai, pois toda a família é da aldeia de Santa Luzia, no concelho de Ourique. “A minha irmã ainda nasceu em Beja, eu já fui nascer a Faro, pois os meus pais mudaram-se para o Algarve”.

A vinda para o Alto Alentejo, essa, diz ter sido “obra do destino” pois, uma vez concluído o doutoramento nos Estados Unidos, e depois de uma passagem por Lisboa, surgiu a oportunidade de trabalhar no IPP. “Quem conhece a qualidade de vida no Alentejo e já viveu em Lisboa, sabe facilmente que é melhor viver aqui. Somos donos do nosso tempo e, apesar dos transportes públicos não serem os mais adequados, Lisboa não fica assim tão distante”. Nem que seja para ir ao Estádio da Luz, lugar de peregrinação como todo o benfiquista bem sabe. Em setembro de 2021 foi eleito presidente do Politécnico. Por unanimidade.

PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL E ENERGIA

Nos últimos seis anos, o investimento do Instituto Politécnico de Portalegre em projetos de investigação subiu de 1,6 para cerca de 33 milhões de euros. De acordo com Luís Loures, 80% desse financiamento “está centrado” nas áreas da produção sustentável, muito ligada à agronomia e veterinária, e na da energia, “seja a valorização energética de resíduos, sustentabilidade, produção de biocombustíveis e reutilização de biomassa”.

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