Nuno Mourinha: “Portugal outra vez a arder”

A opinião de Nuno Mourinha, arqueólogo e diretor do "Brados do Alentejo"

Estamos em 2024 e, novamente, Portugal encontrou-se envolto num inferno de chamas. Parece que esta tragédia é uma sina que nos persegue, repetindo-se ano após ano. Casas ameaçadas, florestas transformadas em cinzas, e comunidades devastadas. E a pergunta surge inevitável: Porquê? O que nos mantém presos a este ciclo de destruição?

A resposta não é simples. As alterações climáticas têm sido implacáveis, trazendo temperaturas mais altas e secas prolongadas que deixam o país à beira da combustão. O solo está seco, as árvores desprotegidas, e qualquer faísca – seja por acidente ou por intenção criminosa – transforma-se num caos ardente. Contudo, não podemos culpar apenas o clima. O abandono das florestas é um problema que também é nosso. Terrenos sem gestão transformam-se em autênticas armadilhas, onde o mato cresce sem controlo e, quando o fogo chega, espalha-se como pólvora.

Até ao final de agosto, o país registava 4457 incêndios rurais, com 10.294 hectares de área ardida. Para muitos, este era considerado um milagre. Mas o destino, sempre imprevisível, virou-se contra nós. Esta semana, o fogo voltou em força, devastando áreas no Norte e Centro.

E basta pouco para que esta esperança se desvaneça. Um único grande incêndio – daqueles que consomem mais de 100 hectares – pode arruinar todo o progresso de um ano. Até agosto, “apenas” 12 destes gigantes haviam sido registados. E agora? O que nos espera? Infelizmente, mais destruição.

O fogo posto continua a liderar as causas dos incêndios, responsável por 31% dos casos investigados. Já as queimadas de sobrantes florestais ou agrícolas, realizadas de forma negligente, representam 13% dos incêndios.

Agosto foi particularmente devastador. Nesse mês, ocorreram 1757 incêndios que destruíram 5843 hectares – mais de metade da área total ardida até agora em 2024. Como é possível que, em apenas 31 dias, vejamos as nossas florestas desaparecerem tão rapidamente?

Precisamos mais do que aviões de combate a incêndios e bombeiros exaustos. O que realmente falta é uma mudança de mentalidade e uma política nacional centrada na prevenção.

É óbvio que algo tem de mudar. Não podemos continuar a viver na esperança de “anos milagrosos”, enquanto ignoramos os problemas estruturais. A prevenção deve ser a nossa prioridade, e as causas têm de ser atacadas pela raiz. Porque, por mais promissor que 2024 tenha começado, continuamos a ser re- féns de um ciclo de destruição que, se não for travado, nos consumirá, incêndio após incêndio.

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