Eis o hotel do sono. Fica em Montemor-o-Novo

Em modo de vagar, a proposta é reencontrar a ligação ancestral à natureza e o prazer de dormir. Eis o Sleep & Nature, em Lavre. Júlia Serrão (texto)

Apresenta-se totalmente integrado na natureza, entre olivais centenários e a planície alentejana. À volta, tudo é silencio, calma e sossego, e até o nome que foi dado ao lugar onde está localizado, o Monte do Vagar, se entretece com a promessa de descanso. O objetivo principal do Sleep & Nature Hotel é manter o sono no centro da experiência e, como tal, tudo foi pensado para reduzir a ansiedade e criar as condições para uma atmosfera que convida a relaxar e a ter noites tranquilas. 

O primeiro hotel do sono em Portugal resulta de uma “conceção antiga” da sua mentora, a médica neurologista Teresa Paiva, de que “para termos saúde temos de nos integrar na natureza”. Defende que a postura da Humanidade face ao meio ambiente, de que se afastou para se julgar dona e senhora e pensar que pode fazer dela o que quiser, “é um erro fundamental”. E está na origem de doenças para os seres humanos, ao mesmo tempos que muitas das atitudes destes afetam o planeta, de que as alterações climáticas são hoje o exemplo mais paradigmático.

Segundo Teresa Paiva,“temos relações com a natureza que são nucleares e antiquíssimas, ancestrais, que nos ligam ao princípio da vida na Terra”. A proposta desta unidade hoteleira é reatar estes laços. 

Para a neurologista, ainda que os tratamentos farmacológicos possam ser importantes, não são a única resposta para as perturbações do sono, havendo outras alternativas. Uma delas passa “pela mudança de comportamentos, de estilo de vida e de conceções” diz, para esclarecer que, ao contrário do que muitas vezes se considera, pequenas mudanças “têm grandes efeitos”. 

Por outro lado, “é necessário integrar as pessoas com a natureza”, o que só acontece, diz, quando sentimos que fazemos parte dela, “numa relação íntima com os seres que nos rodeiam: plantas, animais e clima”. Esta “conexão” está subjacente a uma conceção que a médica tem vindo a desenvolver em termos teóricos e práticos ao longo dos anos, segundo a qual “fazendo gestos milenares e estando próximo da natureza, será mais fácil as pessoas integrarem-se e terem alguma paz”. O Sleep & Nature Hotel propõe essa (re)conexão ancestral.  

ABRANDAR E DESPERTAR AO ENCONTRO DA NATUREZA

Classificado como hotel rural de quatro estrelas, o Sleep & Nature oferece 32 unidades de alojamento, quartos e suitesdecorados com elementos naturais como a pedra e a cortiça, ou artigos regionais. Os tons são claros nas paredes e no mobiliário de linhas direitas, ajudando a criar uma atmosfera tranquilizante. As suites não têm televisão nem café, sendo oferecido apenas chá, o que acontece também nos quartos. O visitante dispõe ainda de pequenas zonas privativas sombreadas e de diversos espaço exteriores para estimular o contacto com a natureza. 

A piscina exterior, com borda “infinita”, é mais uma das ofertas do Sleep & Nature, que possui spa com piscina climatizada, ginásio e biblioteca. No restaurante, a ementa é diversificada e confecionada com os produtos da época e da região, “dos produtores locais”. No spa, que “pretende contribuir para a sensação de paz, segurança e equilíbrio interior” em “conexão com a natureza”, a abordagem é holística, com sauna e massagens “que têm muito sucesso”.  Existe mesmo um ritual pensado ao pormenor que prepara o corpo e o espírito para uma boa noite de sono. O denominado “sleep ritual” compreende a prática de meditação com vista a aquietar a mente, um escalda-pés com sal e plantas com propriedades calmantes, uma prática de cura muito utilizada pelos nossos antepassados, e uma massagem corporal relaxante.  

A contar pelas taxas de ocupação que “têm sido altas, e as classificações são muito boas no geral”, o hotel, diz a proprietária, “não frusta as expectativas”. As pessoas gostam, voltam “e recomendam”. Mas o projeto ainda não está terminado, explica Teresa Paiva, que espera introduzir outras componentes até fim do ano, nomeadamente passar a dar consultas e fazer exames no local, implementando “uma espécie de clínica no hotel”. 

Desconhece se a permanência na unidade hoteleira já ajudou a adotar estilos de vida saudáveis, mas é o que pretende: “Esse é já um dos objetivos da minha consulta. Quem vai só à espera de remédios para ficar bom, garantidamente, não fica.”

PORTUGUESES DORMEM MAL

A escolha do local para o hotel, em Lavre, aconteceu na sequência de um desejo da neurologista que “andava a sonhar, há muito tempo”, com um espaço no Alentejo, não necessariamente ali. O terreno tem 18 hectares, uma “vista muito bonita de 360 graus em alguns pontos da entrada”, e em redor reina um enorme silêncio. “Ouve-se o silêncio ali, o que não acontece em todo os locais alentejanos. É, de facto, uma terra antiga, e nós sentimos essa antiguidade nas árvores, nas oliveiras centenárias que lá existem”. Tudo conspira para abrandar, para conduzir à calma, ao sossego, sem pressas. Que outro nome poderia Teresa Paiva dar-lhe, se não Monte do Vagar?

Segundo um estudo recente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), metade dos portugueses tem um sono insuficiente ou de má qualidade. A neurologista que se dedica ao sono desde 1983 e é pioneira na matéria, tendo sido responsável pelo primeiro mestrado em sono a nível mundial, em 2005, aponta um conjunto de “disparates” que contribuem para este estado de coisas: “[As pessoas] deitam-se tarde, levantam-se cedo, trabalham muito, fazem pouco exercício ou exercício em excesso, mas a maior parte não faz… jantam tarde. A situação no país não está fácil, pelo que há muito stress e incerteza”. 

Por outro lado, há a questão da alimentação, verificando-se “um excesso de obesidade em Portugal, e o consumo de álcool continua a ser alto”. Explica Teresa Paiva que tudo converge para as perturbações do sono que muitas vezes são abordadas de forma errada, com recurso a “correntes de informação na internet” que ditam o que fazer “para dormir bem ou de imediato”. Consequentemente, “pessoas que não têm uma literacia mais profunda ficam um presas a esse tipo de informação e fazem coisas que muitas vezes são negativas para elas”, aponta, para adiantar que a toxicidade pelo recurso a produtos naturais em grande quantidade, por exemplo, com a justificação de que o natural não faz mal, é uma das situações mais comuns. “Tudo o que é em excesso faz mal”, conclui, em jeito de alerta.

Partilhar artigo:

ASSINE AQUI A SUA REVISTA

Opinião

PUBLICIDADE

© 2024 Alentejo Ilustrado. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por WebTech.

Assinar revista

Apoie o jornalismo independente. Assine a Alentejo Ilustrado durante um ano, por 30,00 euros (IVA e portes incluídos)

Pesquisar artigo

Procurar