Petição lançada por Carmen Garcia quer acabar com contenção física de idosos

Há uma petição a circular na Internet, já com mais de 12 mil assinaturas, para proibir a pratica da contenção física de idosos. O primeiro passo será levar o assunto a debate no plenário da Assembleia da República. Maria Frederica (texto)

Carmen Garcia, enfermeira desde 2009 e autora do blogue “A mãe imperfeita”, reconhece ver esta prática, em lares e hospitais, desde o tempo em que estagiava. A contenção física de idosos é uma prática recorrente em Portugal, não excluindo, logicamente, as instituições sediadas no Alentejo.

Existem alguns lares que não recorrem a este mecanismo. Todavia, a esmagadora maioria de lares e hospitais em Portugal, incluindo os do Alentejo, utilizam a contenção física, muito mais que o desejável. Nascida em Vendas Novas e a trabalhar em Évora, Carmen Garcia sublinha que idealmente este número rondaria o zero e relaciona este fenómeno com a “falta crónica de recursos (humanos e materiais)” de que padecem as instituições portuguesas, levando uma parcela substancial a esconder-se atrás desta prática arcaica e violenta.

Países como o Reino Unido, Suécia e Bélgica já proibiram e criminalizaram a contenção física a idosos. Em França, os responsáveis têm mesmo de assinar um documento que autorize os auxiliares a levantarem as grades das camas dos seus familiares, sendo estas as primeiras medidas de contenção. Se analisarmos os dados, estes países não têm taxas de acidentes ou de quedas mais altas que Portugal. Segundo Carmen Garcia, este é um indicador nítido de que “é possível cuidar sem amarras”.

O objetivo desta petição é que Portugal siga o mesmo caminho que Espanha, onde 2025 será o ano da “contenção zero”, tendo elaborado um documento onde esmiuçou o porquê de a contenção física ser um atentado aos direitos humanos, oferecendo alternativas e legislando sobre esta temática. O propósito é o de regulamentar esta prática, proibindo-a exceto em casos muito específicos, que teriam de ser devidamente justificados por uma prescrição médica que reporte a uma entidade superior competente.

Portugal é o quarto país mais envelhecido do mundo e o segundo da Europa. E para 2050 prevê-se que sejamos o país mais envelhecido do continente europeu. Tendo em consideração esta taxa de envelhecimento, Carmen Garcia reafirma a importância de “garantir que cuidamos dos nossos mais velhos com a dignidade que eles merecem”. Constata que não é isso que acontece, na maior parte dos casos, e lamenta que “continuemos a olhar para os mais velhos como se fossem um peso, um fardo que carregamos. Tendo nós tantos idosos deve- ríamos ter mais consciência que muitos países…e não a temos”.

A primeira subscritora da petição defende uma abordagem menos “paternalista” da medicina e da enfermagem, reiterando uma perspetiva terapêutica nas respostas aos utentes. Aquando de uma reflexão sobre as condições que Portugal tem para garantir a segurança das pessoas, constata serem escassas: “Faltam-nos recursos e profissionais. Temos de lutar para ter esses recursos, em vez de os colmatar atentando à dignidade da pessoa.”

O mote desta petição é “o preço a pagar pela falta de recursos crónica que nós padecemos não pode ser a integridade dos mais velhos”. Carmen Garcia relata casos de utentes que faleceram imobilizados, facto que admite não poder ser “aceitável num país que se diz desenvolvido, que se quer humanista e moderno. Não podemos continuar a branquear esta prática”. A contenção física a idosos é uma “ferramenta” antiquada, violenta e que, em última instância, pode mesmo ser considerada maus-tratos.

Há muitos anos que a enfermeira contacta com esta prática, nunca a tendo realizado. Pelo contrário, optou sempre por assumir por inteiro as consequências que daí pudessem advir. Reitera a urgência de trazer esta discussão ao escrutínio da opinião pública.

“A verdade é que não dá para esperar mais. Estamos em 2024, há respostas alternativas e esta prática continua a perpetuar-se”, sublinha Carmen Garcia afirmando que “amarrar alguém é atentar contra a sua dignidade, contra os seus direitos mais básicos, os direitos humanos de liberdade. É um maltrato. Em 2024, não há nenhum motivo válido que justifique usá-la”.

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