Presidente da Câmara de Borba começa a ser julgado dia 3 de outubro

Caso da estrada de Borba que provocou a morte a cinco pessoas vai chegar, finalmente, a julgamento. António Anselmo, o presidente da Câmara, está acusado de cinco crimes de homicídio. Luís Godinho (texto)

O Tribunal de Évora marcou para o próximo dia 3 de outubro o início do julgamento do presidente da Câmara de Borba, António Anselmo, acusado de cinco crimes de homicídio, e de outros cinco arguidos, no caso da derrocada da estrada de Borba. 

Além de António Anselmo e da empresa Ala de Almeida, serão igualmente julgados Joaquim Espanhol (vice-presidente da Câmara de Borba), Bernardino Piteira e José Carlos Pereira (funcionários da Direção-Geral de Energia e Geologia), acusados, respetivamente, de três e de dois crimes de homicídio por omissão. Já Paulo Nuno Alves, responsável técnico da empresa ALA de Almeida, em cuja pedreira onde ocorreu a derrocada, responderá por dez crimes de violação de regras de segurança, dois dos quais agravados.

Um longo acórdão do Tribunal da Relação de Évora, que determinou a não pronúncia de dois outros arguidos, permite reconstituir a cronologia dos acontecimentos. A começar pelo dia 14 de junho de 1988, quando deu entrada na Direção Geral de Geologia e Minas o primeiro plano de lavra para a exploração da pedreira do Olival Grande, entre Borba e Vila Viçosa. A licença de exploração foi atribuída em maio de 1989. Data de 1993 uma atualização do plano de lavra, onde se menciona a inexistência de “zona da defesa na parte da pedreira confinante com a pedreira do Carrascal, porquanto se procedera à unificação das explorações”.

Depois, é solicitada autorização para exploração de mármore até 27,5 metros da Estrada Municipal 255, “referindo-se que seriam tomadas medidas de segurança por forma a suportar as fraturas, através do enchimento dos vazios existentes entre as rochas com betão e a construção de um murete”.

Este pedido foi objeto de parecer negativo por parte do Ministério da Economia. De acordo com a acusação, em 2015 foi realizado “novo plano de lavra da pedreira no qual aparece identificada e analisada a situação de instabilidade do talude” adjacente à Estrada Municipal 255, “sugerindo-se a adoção, como solução, de medidas técnicas de pregagens de sustentação”.

A pedreira continuou em exploração até novembro de 2018. A acusação sustenta que “os problemas de estabilidade do talude” das pedreiras do Carrascal e Olival Grande, confinante com a estrada, “estavam identificados há vários anos”, sendo do conhecimento “de todos os arguidos”.

Um estudo do Centro de Geotecnia do Instituto Superior Técnico, realizado em 2003, refere que “o paralelismo entre as direções daquele talude e da principal fratura que o pode instabilizar é conhecido pelos especialistas como uma das condições essenciais para ocorrer um fenómeno de rotura ou deslizamento planar”. O alerta estava dado, mas passariam ainda vários anos até à derrocada fatal.

A acusação lembra que em janeiro de 2014, 11 anos depois desta alerta, decorreu uma reunião na Câmara de Borba, em que participaram autarcas e exploradores de pedreiras, “na qual foi analisada e discutida a situação de insegurança” da Estrada Municipal 255, “ponderando-se a possibilidade de ser desativado” este troço.

Na reunião, acrescenta o Ministério Público, o presidente da Câmara de Borba, António Anselmo, “consciente da problemática e riscos de desmoronamento do talude e consequentemente da estrada”, solicitou um parecer sobre os riscos existentes.

Todavia, prossegue a acusação, “a atividade extrativa na pedreira do Olival Grande continuou em local não autorizado, incidindo sobre o talude em causa”, o que motivou a reclamação do proprietário de uma pedreira contígua “dando conta do derrube de pedras e escombros”.

CINCO VÍTIMAS TRAGÉDIA

A 19 de novembro de 2018, cerca de 15h45, viria a ocorrer “um deslizamento no maciço rochoso” que constituía o talude das pedreiras do Olival e do Carrascal, confinante com a Estrada Municipal 255, “levando ao consequente desmoronamento de um grande volume de massa rochosa e pedra de suporte do aterro onde assentava aquela estrada, culminando no seu abate parcial e derrocada para o interior daquelas pedreiras”.

Por essa hora, Gualdim Pita, encontrava-se a trabalhar junto de uma escavadora. “Ao aperceber-se da derrocada entrou no interior da máquina no intuito de a retirar do local, todavia acabou por ser arrastado” pelos blocos de pedra. João Xavier, que trabalhava no fundo da pedreira do Olival Grande, foi atingido por “massa e blocos de pedras”, ficando soterrado. José Rocha e Carlos Lourenço seguiam num veículo automóvel que “foi arrastado” para o fundo da pedreira. Tal como José Galhardo Ruivo, que seguia na mesma estrada. Foram as cinco vítimas mortais da derrocada.

A acusação sustenta que António Anselmo e o vice-presidente da Câmara de Borba, Joaquim Espanhol, “estando ao corrente do identificado perigo de deslizamento” do talude, “não evitaram” a ocorrência do acidente. Já a ALA de Almeida e responsáveis pela empresa, “ao invés daquilo que o circunstancionalismo concreto suscitava e lhes impunha, considerando o seu conhecimento da instabilidade do talude em causa e consequente risco elevado de derrocada”, permitiram a laboração da pedreira, “não obstante a gravidade da situação e do perigo que representava.

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