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Rui Arimateia: “O direito à cidade usufruindo um património comum”

Vem a propósito o aviso de José Saramago, em 1997, quando advertia as autoridades eborenses para não transformarem Évora (numa Veneza), fazendo reféns os seus habitantes da turistificação exagerada.
Rui Arimateia (texto)

Primeiro pressuposto importante: A coisa pública deverá ser encarada como responsabilidade última dos cidadãos e considerada como facto real fundamental para a melhoria da qualidade de vida individual e coletiva das comunidades.

Segundo pressuposto: A importância do olhar a realidade refletindo sobre três conceitos subjacentes a toda a intervenção, a memória (o passado), a identidade (o presente) e a partilha (o futuro). É claro que não poderemos considerar estes três conceitos em compartimentos estanques. O passado e presente e o futuro encontram-se num diálogo permanente e em mutação contínua, interagindo uns com os outros e a todo o momento, para a construção de um eterno presente, esse que nós vivenciamos em verdade.

Só partilhando e dialogando vislumbraremos algum futuro construtivo e luminoso. Importa edificar uma praxis de intervenção equilibrada. Tal como dizia Leopold Senghor: “É fundamental pensar para agir e agir para pensar melhor”.

Outro conceito importante a ter em conta é o da participação dialogante. Participação para a melhoria das condições de vida em territórios em mudança… Impõe-se novamente e sempre o diálogo e a partilha e atrevo-me a propor a recuperação de uma metodologia de intervenção dos anos 80 que defendia que small is beautiful… com todas as implicações socioculturais, ecológicas e holísticas daí resultantes. Participar é dialogar e estar aberto e disponível para a escuta do e com o outro e para a mudança com o outro.

E porque tantas vezes se fala em democracia participativa… “É hora!”, como dizia o poeta, para começarmos, de facto, a utilizar aquelas frases e conceitos, compreendendo em profundidade e valo- rizando os ensinamentos inerentes, os que ajudarão a salvar a humanidade! Pois, tal como diria Almada Negreiros: “Quando eu nasci, as frases que hão de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa – salvar a humanidade”.

Importa não esquecer a expressão tantas vezes enunciada, mas poucas vezes compreendida e utilizada, pelos técnicos da requalificação e da revitalização dos patrimónios: As pessoas em primeiro lugar! Não esquecendo que também existem pessoas que são património, inclusivamente consideradas pela Unesco como Tesouros Humanos Vivos.

São as pessoas as criadoras, as inventoras e as construtoras do património. Contudo, o reverso da medalha também importa ter em atenção: são também as pessoas os principais autores de desequilíbrio e de destruição do património, por erróneas escolhas de intervenção (ao nível financeiro, da exacerbação dos consumos, da desconstrução das paisagens tradicionais – no campo ou na cidade). No fundo, são as pessoas os responsáveis por desequilibrados e desadequados paradigmas verdadeiramente humanos que deixamos como legado “armadilhado” aos nossos filhos e netos.

Vem a propósito o aviso de José Saramago aquando do lançamento do livro “Évora – Património da Humanidade”, que assinou conjuntamente com Eduardo Gageiro em 1997, quando advertia as autoridades eborenses para não transformarem Évora (à sua escala) numa Veneza, fazendo reféns os seus habitantes do elevadíssimo custo de vida que a turistificação exagerada fez acontecer… Estaremos desta maneira a destruir um património de excelência e a transformá-lo em mais um objeto de e para consumo imediato de tão somente alguns.

Finalmente, não esqueçamos a importância da implementação de instrumentos para o garante da salvaguarda dos patrimónios imateriais que no fundo definem a identidade cultural de Évora, do seu concelho e do Alentejo. Não há centros históricos sem vida.

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