Talento que fica: como o Alentejo está a apostar na robótica inteligente

O projeto AIRA – AI Robotics Academy representa a visão de um Alentejo que não se resigna ao seu papel periférico, mas que procura afirmar-se como território de excelência na investigação, na inovação e na formação avançada. É um convite aberto a quem procura estar na linha da frente do progresso tecnológico. Soumodip Sarkar (texto)

Ao longo das últimas décadas a tecnologia tem vindo a assumir um papel absolutamente central na transformação da sociedade e da economia. Já não se trata apenas de uma ferramenta que facilita os processos, e é agora uma verdadeira infraestrutura de conhecimento, capaz de moldar a maneira como trabalhamos, comunicamos e até como pensamos.

Entre os campos mais desafiantes e promissores destacam-se a inteligência artificial e a robótica, que caminham cada vez mais deforma interligada e que estão a criar uma geração de soluções para problemas globais. Desde os sistemas de diagnóstico médico que utilizam algoritmos de aprendizagem automática, até veículos autónomos ou linhas de produção inteligentes. Na indústria, já se detetam peças com defeitos em segundos, e já temos robôs a fazer o mapeamento de stocks e a realizar entregas internas sem parar.

A União Europeia estima que, até 2030, irão ser necessários 20 milhões de especialistas em tecnologias da informação e comunicação, mas os números atuais estão longe desse objetivo. Em sectores como a inteligência artificial e a robótica, a procura supera largamente a oferta. Este défice é agravado pelo facto de apenas cerca de 25% dos estudantes em cursos de engenharia e tecnologias da informação serem mulheres, apesar de estas representarem mais de metade dos alunos do ensino superior.

Em Portugal, a situação é semelhante e a resistência de muitas pequenas e médias empresas à adoção de novas tecnologias limita ainda mais a capacidade de inovação e de crescimento em sectores de elevado valor acrescentado.

É precisamente neste contexto que se compreende a relevância do Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia (PACT). Mais do que um centro de inovação, o PACT funciona como um ponto de encontro entre as universidades empresas e empreendedores, facilitando a cria- ção de conhecimento partilhado e o desenvolvimento de novos negócios.

A missão é clara: transformar o Alentejo num território do futuro, capaz de atrair talento, gerar oportunidades qualificadas e garantir que a região participa ativamente na economia do conhecimento. Não se trata apenas de acompanhar as tendências, mas de criar as condições para que estas se desenvolvam localmente, valorizando os recursos humanos e estimulando um tecido empresarial cada vez mais competitivo.

A região do Alentejo enfrenta, como tantas outras periféricas da Europa, o desafio da retenção de talento jovem e altamente qualificado. Muitos dos estudantes procuram oportunidades lá fora, levando consigo as competências que seriam cruciais para revitalizar a economia regional. Apostar em áreas emergentes como a robótica inteligente é, por isso, um movimento estratégico. Ao associar-se a parceiros internacionais de referência, o PACT pretende criar as condições necessárias para que o Alentejo se afirme como um polo de inovação com impacto europeu.

É neste cruzamento entre a ambição regional e a visão global que surge o projeto AIRA – AI Robotics Academy. Integrado na EIT Deep Tech Talent Initiative, o projeto responde a uma necessidade real: a carência de profissionais capazes de aplicar inteligência artificial a sis- temas robóticos. Ao mesmo tempo, assume um compromisso claro com a diversidade, estabelecendo uma meta clara para que, pelo menos, 35% dos participantes sejam mulheres, tentando assim combater o desequilíbrio de género que continua a marcar o sector tecnológico.

A formação foi concebida para o nível sete do Quadro Europeu de Qualificações e combina rigor académico com aplicação prática, com a intenção de garantir que cada formando sai não apenas com conhecimentos, mas com experiência tangível.

Os módulos percorrem fundamentos de aprendizagem automática e redes neuronais até áreas avançadas como na- vegação autónoma, planeamento de movimento e visão por computador. A proposta é formar especialistas preparados para atuar em sectores de rápido crescimento, como a saúde digital, a indústria transformadora, os transportes inteligentes e até a exploração aeroespacial, criando, assim, um novo perfil de profissionais com competências multidisciplinares e de elevada empregabilidade.

O curso decorre online e é de aprendizagem autónoma, com aulas assíncronas, mate- riais de apoio e sessões semanais de perguntas e respostas. As inscrições são feitas através da plataforma moddlepact.pt, destina-se a quem já tem bases de programação.

Mas o projeto não se esgota na vertente formativa, incluindo, também, um programa de empreendedorismo que dá aos participantes ferramentas para transformar ideias em negócios, e um concurso de inovação, onde os formandos são desafiados a criar aplicações originais utilizando inteligência artificial aplicada à robótica. Estas atividades não só estimulam a criatividade, como aproximam o sector académico e o empresarial, criando assim pontes fundamentais para que a inovação se traduza em valor económico e social.

Outro elemento que diferencia o AIRA é a preocupação em criar uma comunidade. Através de sessões de perguntas e respostas, eventos de aceleração e roadshows, os participantes são incentivados a partilhar experiências, a co- laborar e a desenvolver redes de contacto que se prolongam para lá do curso.

O impacto esperado para o Alentejo vai muito além da formação de profissionais altamente especializados. Trata-se de construir massa crítica na região, de criar condições para que as empresas locais possam inovar e competir em mercados globais, e de oferecer aos jovens uma alternativa sólida à emigração de talento. Trata-se de reforçar a ligação do Alentejo às redes europeias de inovação, posicionando-se como parceiro ativo em iniciativas transnacionais e reforçando o contributo português para o mercado digital.

O AIRA é um compromisso estratégico com o futuro. Representa a visão de um Alentejo que não se resigna ao seu papel periférico, mas que procura afirmar-se como território de excelência na investigação, na inovação e na formação avançada. É um convite aberto a quem procura estar na linha da frente do progresso tecnológico. Num tempo em que a tecnologia se tornou no idioma universal do desenvolvimento, o PACT escolheu não apenas aprender essa língua, mas como ensinar a dominá-la com confiança e ambição.

O autor é presidente executivo do Conselho de Administração do Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Partilhar artigo:

ASSINE AQUI A SUA REVISTA

Opinião

CARLOS LEITÃO
Crónicas

BRUNO HORTA SOARES
É p'ra hoje ou p'ra amanhã

Caro? O azeite?

PUBLICIDADE

© 2025 Alentejo Ilustrado. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por WebTech.

Assinar revista

Apoie o jornalismo independente. Assine a Alentejo Ilustrado durante um ano, por 30,00 euros (IVA e portes incluídos)

Pesquisar artigo

Procurar