O Alentejo é a região do país onde os jovens de 18 anos mais consomem álcool, segundo dados do relatório “Comportamentos Aditivos aos 18 anos”, divulgado pelo Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD).
De acordo com o documento, “ainda que e a ingestão de bebidas alcoólicas e os comportamentos de risco acrescido associados ao álcool registem uma tendência de descida entre os inquiridos (o que não se verifica quando a análise se restringe aos consumidores)”, comparativamente ao estudo anterior, o Alentejo “continua a destacar-se pelas prevalências mais elevadas do país, sendo que, em alguns indicadores relativos à ingestão de bebidas alcoólicas, a discrepância até aumentou”.
Isto acontece porque “no que ao álcool diz respeito, no Alentejo, a descida verificada entre 2022 e 2023, com exceção da embriaguez severa e do consumo diário de álcool, foi sempre menos expressiva do que a verificada no resto do país, aumentando, assim, o fosso para as demais regiões”.
Relativamente ao consumo de tabaco entre os jovens desta faixa etária, que nos últimos anos tem vindo a revelar uma “clara tendência de descida” em todas as regiões, o Alentejo volta a destacar-se pelas prevalências mais elevadas, “claramente acima das restantes regiões”, ainda que tenha obtido valores em 2023 ligeiramente inferiores a 2022.
“Também neste caso aumentou o fosso do Alentejo para a maior parte das regiões, uma vez que se registou aí um acréscimo bem menos expressivo do que no resto do país”, refere o relatório, concluindo que o Alentejo é ainda a região onde o cruzamento de duas ou mais drogas tem maior expressão.
Porque é que os jovens alentejanos continuam no pelotão da frente em matéria destes consumos? Essa é a resposta que as instituições e os técnicos continuam a procurar, enquanto vão implementando medidas para conter o fenómeno.
Em dezembro passado, o Centro de Respostas Integradas (CRI) do Alentejo Central realizou um encontro dirigido à comunidade técnica e académica da região, “para refletir até que ponto a solidão não será o gatilho dos comportamentos aditivos”, diz o seu coordenador.
Paulo de Jesus explica que estão a organizar-se cada vez mais à volta da seguinte questão: “Em que medida uma realidade dolorosa [a solidão] do ponto de vista sociocultural e socioeconómica do interior não ativa a procura de alienação da realidade, seja atra- vés de uma substância psicoativa ou através do comportamento aditivo?”
Outro indicador importante, que não consta no estudo, é o facto de o Alentejo ser “a região mais deprimida do ponto de vista demográfico do país”, referindo apenas que é o território onde os jovens cruzam mais álcool, ansiolíticos e antidepressivos.
Sublinhando que o estudo elenca o Alentejo, o Algarve e os Açores como regiões de maior consumo de álcool e tabaco, de canábis, e de outras drogas ilícitas que não canábis, respetivamente, Paulo de Jesus nota: “De alguma maneira vamos ‘isolando’ este fator solidão comum, sendo aquele que à partida está a fazer a diferença nos números apresentados”.
A saúde mental é outro fator a ter em conta, porque “não é despiciendo pensar” que a falta de oportunidades económicas para ser-se autossuficiente afeta a autoestima, podendo levar ao “afogar as lágrimas à volta do álcool”.
No consumo de álcool há também questões culturais muito enraizadas e outros fatores a considerar, para além dos referidos. É aceite social- mente, de acesso fácil, e as famílias ainda são permissivas relativamente à questão, com o falso argumento que “pior seria se fosse droga”, sendo que o álcool “é a droga depressora do sistema nervoso central que mais mata”.
Para mitigar a situação, o CRI do Alentejo Central quer assentar a intervenção baseando-se em “evidências cientificas”, incluindo nos estudos facilitados pelo Observatório dos Consumos no Alentejo – constituído por investigadores da Universidade de Évora e diversas parcerias, nomeadamente a Divisão de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (DICAD) da ARS Alentejo.
A ideia é usar esta informação para conhecer a realidade, e depois “alinhar a intervenção” nos vários contextos, a começar pelos da diversão, tendo em conta que “uma parte significativa da experimentação e da iniciação do consumo do álcool e das substâncias ilícitas ocorre nas festividades”.
O Centro está também a produzir “materiais específicos de informação e sensibilização para contexto escolar”. Relativamente ao espaço de intervenção comunitária, estão a trabalhar com os municípios, onde procuram ter equipas multidisciplinares que cruzam associações de pais, Comissões de Proteção das Crianças e Jovens, associações desportivas locais, escola, forças de segurança e autoridades de saúde.