No dia 13 de março de 2025 foi publicada, finalmente, a Lei n.º 25-A/2025 que veio repor, no âmbito do processo simplificado, as freguesias extintas com a Lei n.º 11-A-/2013 e em cumprimento do artigo 25.º da Lei n.º 39/2021.
Começamos logo mal quando temos que referir tantas leis, mas a verdade, porém, é que a comunicação social inundou as redes e quis lançar a dúvida sobre a entrada em vigor da Lei agora publicada e os seus efeitos. Tentemos então esclarecer:
Comecemos pela Lei n.º 39/2021 de 24 de junho que veio definir o regime jurídico de criação, modificação e extinção de freguesias e revogar a Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, que procedeu à reorganização administrativa do território das freguesias.
É ao abrigo do artigo 25.º dessa mesma Lei que foi criado um regime simplificado e transitório que só seria possível ser utilizado com um prazo curto, o que levou, inclusive, a que algumas Uniões de Freguesias que o haviam solicitado não tivessem sido repostas por incumprimento dos prazos.
Assim, determinava o artigo 25.º, que passamos a transcrever:
Artigo 25.º
Procedimento especial, simplificado e transitório
1 – A agregação de freguesias decorrente da Lei n.º 22/2012, de 30 de maio, que aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica e da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, que procede à reorganização administrativa do território das freguesias, pode ser transitoriamente corrigida, se fundamentada em erro manifesto e excecional que cause prejuízo às populações, e desde que cumpra os critérios previstos nos artigos 5.º a 7.º, com exceção do disposto no n.º 2 do artigo 6.º e no n.º 2 do artigo 7.º da presente lei.
2 – O procedimento previsto no n.º 1 tem início no prazo de um ano após a entrada em vigor da presente lei, através dos procedimentos definidos nos artigos 10.º a 13.º, na sequência de deliberação por maioria simples das respetivas assembleias de freguesia e assembleia municipal.
3 – A desagregação de freguesias prevista no presente artigo respeita as condições em que as mesmas foram agregadas anteriormente, não podendo, em caso algum, dar origem a novas ou diferentes uniões de freguesias.
O artigo que tem criado mais complexidade tem sido o 15.º da Lei n.º 39/2021 que determina o seguinte:
Artigo 15.º
Suspensão da criação de freguesias
1 – Não é permitida a criação de freguesias durante o período de seis meses imediatamente antecedente à data marcada para a realização de quaisquer eleições a nível nacional.
2 – No caso de realização de quaisquer eleições intercalares, a proibição do número anterior abrange apenas a criação de freguesias que se encontrem envolvidas naquele ato eleitoral.
3 – A proibição prevista no número anterior abrange todo o período posterior ao facto que as determinou até à realização do ato eleitoral.
4 – A eleição dos titulares dos órgãos das freguesias criadas ao abrigo da presente lei ocorre na data da realização, a nível nacional, das eleições autárquicas seguintes.
Mas é exatamente este artigo que dá a resposta necessária às dúvidas que têm vindo a ser levantadas na comunicação social e têm criado algum alvoroço, com ameaças de boicote eleitoral pelas populações envolvidas.
Escalpelizemos o artigo 15.º e comecemos pelo fim, ou seja, pelo n.º4.
A instalação e eleição dos órgãos das freguesias (assembleia de freguesia e junta de freguesia – esta por eleição indireta) criadas ao abrigo da presente lei e , por consequência, da agora Lei n.º 25-A/2025, só poderá ocorrer na data da realização, a nível nacional, das eleições autárquicas seguintes.
Ora, tal como resulta desta norma, teremos que preparar as eleições para as novas freguesias sendo que as mesmas só poderão ser instaladas após a realização das eleições. Nem pode ser de outra forma. Caso assim não fosse, teríamos que ter levado a cabo eleições intercalares, o que a Lei, nitidamente, não permite.
Assim, aqueles que vêm dizendo, com base neste dispositivo que a Lei só se aplicaria às autárquicas de 2029, não têm, salvo o devido respeito, qualquer fundamento legal para defender essa tese.
A interpretação do n.º1 do artigo 15.º deve ser realizada em conjunto com o n.º 2, e tem a ver essencialmente com a questão de realização de eleições intercalares e da interpretação que deve ser dada a qualquer eleição a nível nacional.
As eleições intercalares só estão previstas, ao nível da Lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, a saber, nomeadamente nos artigos 222.º e seguintes da Lei Orgânica n.º 1/2001 na sua versão atual e são intercalares porque servem apenas e só para completar o mandato em curso, devendo ser realizadas novas eleições na altura em que se proceder à marcação de eleições nacionais para as autarquias locais.
Mais importante sobre esta matéria tem sido a interpretação assente da Comissão Nacional de Eleições e da jurisprudência dos Tribunais Superiores sobre a contagem do limite de mandatos em sede de eleições intercalares, ou seja, os mandatos são contados como se de uma eleição efetiva se tratasse contando para o limite de mandatos do presidente da junta, ainda que o mesmo apenas esteja nove meses em funções após as eleições intercalares.
É nesse sentido que apenas se pode entender o limite imposto pelo n.º1 do artigo 15.º, ou seja, que as eleições nacionais (por contraposição às intercalares) serão as autárquicas e não as de outra natureza, tendo em conta que só estas é possível perceber e estão devidamente balizadas, e determinando o artigo 15.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, na sua versão atual que as eleições autárquicas serão marcadas pelo Governo até 80 dias antes da data, devendo ser agendadas entre 22 de setembro e 14 de outubro de 2025.
Quaisquer eleições legislativas antecipadas não podem pôr em causa esta interpretação, até porque não são previsíveis, constituindo, por si só, um elemento anómalo (embora ultimamente cada vez mais normal) do ordenamento jurídico/constitucional do país.
Assim, só do entendimento de que a criação das freguesias ao abrigo da Lei n.º 25-A/2025 de 13 de março, não só é legítima, como legal, não estando agendadas, ainda, quaisquer eleições a nível nacional, sendo que a publicação da Lei foi feita mais de seis meses antes da primeira data possível para a realização das eleições autárquicas (22 de setembro de 2025).
Mas se mais dúvidas resultassem, teríamos de fazer uso da interpretação das normas contidas na própria Lei n.º 25-A/2025, de 13 de março que fazem referência específica a datas do ano de 2025, a saber:
No tocante à Comissão de Extinção, prevista no artigo 5.º, n.º2 da Lei n.º 25-A/2025 de 13 de março, é constituída e toma posse no prazo de 30 dias após a entrada em vigor da presente lei, e funciona até à conclusão da última instalação dos órgãos eleitos nas eleições autárquicas de 2025.
O n.º 6 deste mesmo artigo refere ainda uma data relevante: o inventário atualizado é aprovado até 31 de maio de 2025.
O artigo 8.º, no seu n.º 1 determina que: até 15 de junho de 2025, a comissão de extinção de freguesia aprova os mapas finais de transferência de bens móveis e imóveis, de universalidades, direitos e obrigações e de trabalhadores para cada freguesia a repor.
E o n.º 2 desse mesmo artigo veio estabelecer mais um prazo curto: os mapas finais referidos no número anterior são ratificados pela assembleia de freguesia até 30 de junho de 2025.
Convém referir, ainda, que a Comissão Instaladora prevista no artigo 9.º da Lei n.º 25-A/2025, de 13 de março tem de ser constituída até 31 de maio de 2025 e tomar posse até 1 de julho de 2025.
O artigo 13.º vem ainda referir que a instalação dos órgãos das freguesias resultante das eleições autárquicas de 2025 obedece aos atos previstos no artigo 8.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro.
E o artigo 14.º, n.º1, vem reportar a produção de efeitos da reposição das freguesias ao momento da instalação dos seus novos órgãos eleitos nas eleições autárquicas de 2025.
E completa o n.º 2 do artigo 14.º que a extinção de freguesias prevista no artigo 2.º produz efeitos no momento da conclusão da última instalação dos órgãos eleitos para as freguesias que lhe sucedem.
Não consigo, por isso, perceber de onde resulta a interpretação ‘sui generis’ de que as freguesias repostas só o poderiam ser a partir de 2029.
Não foi esse o espírito da Lei, nem foi esse o espírito do legislador.
Quanto à dúvida colocada por força de eventuais dificuldades nos cadernos eleitorais, resta explicar que os mesmos se encontram organizados tal como antes de 2013, ou seja, por exemplo, na União de Freguesias presidida pelo responsável pelo presente texto, temos a letra A referente aos eleitores da antiga freguesia de Nossa Senhora da Vila, a letra B relativa à antiga freguesia de Nossa Senhora do Bispo e a letra C referente à freguesia de Silveiras, pelo que nada será colocado em causa nesta matéria.
Quanto aos prazos, estes estão e serão todos cumpridos, ao contrário do que é costume na Administração Central, nas freguesias as coisas realizam-se…
O que seria da democracia em Portugal se as freguesias, os seus funcionários e os eleitos das Juntas de Freguesia não estivessem no terreno a resolver os problemas que surgem nos atos eleitorais?
Vamos ao trabalho, para que as freguesias sejam todos repostas em condições nas autárquicas de 2025.
* O subscritor do presente texto é advogado, presidente da Junta de Freguesia da União de Freguesias de Nossa Senhora da Vila, Nossa Senhora do Bispo e Silveiras e é vogal do Conselho Diretivo da Associação Nacional de Freguesias, mas o conteúdo do presente texto apenas o vincula a ele.