Sou branca, sou preta, sou castanha e amarela. Às vezes, quando a tristeza me domina, sou cinzenta, outras vezes, quando a indignação é forte, sou verde. Também sou vermelha quando a emoção transborda do cérebro até à pele. Raramente sou azul, mas em certas manhãs, quando o horizonte marítimo se torna infinito, é essa a minha cor. Sei que não tenho sangue azul e que o sangue que me corre nas veias é igual ao de toda a gente: plasma, glóbulos brancos, glóbulos vermelhos, plaquetas e outras coisas que não sei o nome.
Sou portuguesa, sou alentejana, mas também sou espanhola e tenho em mim, com toda a certeza, genes de romanos, árabes, ciganos e muitos outros povos que por este espaço, onde tive a sorte de nascer, circularam e circulam. Não sei se sou, mas sei que gostaria de ser índia. Também sou um pouco dos livros que li de escritores asiáticos, americanos, africanos e europeus e de todas as obras de arte que fui apreciando ao longo da vida. Há em mim todos os sonhos dos poetas, muitas teorias de filósofos e filósofas e muitos ensinamentos de todas as religiões. E também toda a vontade de aprender de tantos alunos e alunas que, em dezenas de anos, me incentivaram a fazer melhor.
Sou aldeã, raiana e citadina. Tento ser cosmopolita. Sou as histórias que me contaram, a família que me educou e amparou, que protejo e amo, os amigos que me engrandeceram. Numa palavra, sou mestiça. Tudo em mim, do sangue à cultura, se mistura.
Nos últimos tempos tem crescido algo que já vinha de trás: a islamofobia, fazendo acreditar numa iminente invasão islâmica, o ódio aos imigrantes e a pessoas com cor de pele diferente. Voltaram a ouvir-se as expressões “vai para a tua terra”. Cresce o nacionalismo bacoco, associado à ideia de “raça” e ouvem-se novas expressões, como, por exemplo, “potugueses de sangue”. Será que existem portugueses que não têm sangue? Como é possível tama- nho desconhecimento da nossaHistória, a mesma que dizem de- fender? Como a podem defender se nem sequer a conhecem?
É nestes momentos, em que cresce a violência da extrema-direita, dos neo-nazis, que percebemos melhor a importância da escola e do ensino da História, da Geografia, da Biologia e de muitas outras disciplinas. A melhor medida para combater o racismo é, sem dúvida, a Educação. Para além disto, as instituições deverão cumprir o seu papel e não permitir a violência (verbal e física) dos grupos neo-nazis. A tolerância tem limites e um deles é o da intolerância. O discurso do ódio e os crimes de ódio não podem ser tolerados! E não esquecer: as instituições e os seus responsáveis também têm o dever de dar o exemplo de comportamentos cívicos e de cidadania, ou seja, de respeito pelos outros.
Penso que, juntamente com estas, existe outra medida que se torna urgente: sugerir a todas essas pessoas que se consideram superiores pela cor da sua pele, pelo seu lugar de nascimento ou por qualquer outra característica que realizem testes de ADN. Puros, só os anjos. No mundo dos humanos somos, cada um de nós, uma grande mistura. E a verdade é que, queiramos ou não, gostemos ou não, somos todos mestiços.