Breno Teixeira: “O êxodo tupiniquim”

A opinião de Breno Teixeira, cronista

Portugal! Terra de brandos costumes, fado, bacalhau e, mais recentemente, do eldorado para o imigrante brasileiro. Não é de hoje que o Atlântico se tornou um rio de águas turvas para uns e ponte dourada para outros, mas a onda migratória tupiniquim dos últimos anos, que merece um capítulo à parte, e talvez um bom vinho para digerir (um Alvarinho pra combinar com o ar de superioridade).

Dizem as más-línguas, e as boas também, com uma pitada de sal grosso e limão na beirada do copo, que vir para Portugal era coi- sa de quem tinha um avô português, um sonho distante ou uma fuga planeada da inflação galopante. Hoje a narrativa mudou. O brasileiro, astuto e sempre em busca de novas aventuras (ou de uma vida com menos tiros), descobriu que o “além-mar” não era tão distante assim e que a Europa, ora bolas, falava português!

E assim, a pátria-mãe gentil, que já exportou boleiros e modelos, passou a exportar o cidadão comum. O padeiro, o influenciador digital que faz dancinha no TikTok com a Torre de Belém de fundo, a esteticista que promete a brow lamination perfeita, o médico que se reinventa como entregador, o engenheiro que vira barista, o açougueiro que só quer saber de “bifes da vazia”, o professor de jiu-jitsu que tenta convencer os portugueses a lutar no chão, a designer de sobrancelhas que ensina a “técnica do fio a fio”… uma verdadeira caravana de talentos (e alguns nem tanto, tipo o coach quântico) desembarcando em Lisboa, Porto e até na mais recôndita aldeia alentejana, onde o único movimento é o vento batendo na roupa no varal, ou será estendal.

A chegada é sempre um espetáculo à parte. Munido de uma mala com mais expectativas do que roupas e um sotaque que denuncia sua origem a quilómetros de distância, logo se depara com a realidade lusitana. A primeira surpresa: o pão sem o tal “miolo” que esperava. Parece um tijolo comestível. O segundo choque: o café. Uma bica minúscula que, para o paladar acostumado a baldes de café coado com açúcar até empelotar a língua, mais parece uma gota de café diluído em esperança. Mas nada que um “cafezinho” reforçado não resolva, afinal, a adaptabilidade é a marca do brasileiro, principalmente quando a opção é passar vontade.

O próximo passo é a caça ao apartamento, esse ser mitológico que, para o imigrante, se torna mais raro que unicórnio alado com chifre de ouro. Como a esperança é a última que morre, e lá vai ele, o bravo imigrante, morar em um T0 com mais três conterrâneos, todos sonhando com o dia em que terão um T1 só para si, com direito a varanda para estender cuecas.

E a língua, essa traiçoeira! Por mais que seja português, as nuances são um prato cheio para a comédia (ou o desespero de querer enfiar a cabeça no chão). “Propina” não é corrupção, é mensalidade (e ninguém quer pagar isso!). “Fixe” é legal. “Bicha” não é xingamento, e “pica” não faz parte do corpo (graças a Deus!). E que venha o “puto”, a “gaja” e o “giro” , que o brasileiro, com o seu gingado que contagiam até os mais sisudos, logo incorpora ao vocabulário, muitas vezes sem saber o real significado, gerando situações hilárias e, ocasionalmente, constrangedoras, tipo quando ele chama a vendedora de “minha flor” e ela olha torto.

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