“Crisântemos” e os primeiros versos de Florbela em papel impresso

Há um dado até agora pouco conhecido sobre a vida e obra da poetisa Florbela Espanca, revelado em “Dicionário de Florbela Espanca”, recentemente editado - a revista “Modas & Bordados” foi a primeira utilizada pela poetisa para publicar as suas obras.

Considerada uma das maiores poetisas portuguesas do século XX, Florbela Espanca nasceu em Vila Viçosa e deixou um legado de obras como “Livro de Mágoas”, “Charneca em Flor”, “As Máscaras do Destino” e “O Dominó Preto”. Um conjunto literário que, sabe-se agora, começou a ganhar forma tinha ela 22 anos, através de poemas publicados na revista “Modas & Bordados”, à época dirigida por Isabelle Carizey de Carvalho.

Fundada a 14 de fevereiro de 1912, como suplemento do jornal “O Século”, a “Modas & Bordados” era dirigida a mulheres, essencialmente das classes media e alta, com receitas e conselhos de moda, mas também promovia a publicação de poesias das “artistas de letras”.

Segundo o verbete dedicado ao tema, escrito por Adriana Mello Guimarães, doutorada em Literatura pela Universidade de Évora, a primeira publicação de Florbela na revista está datada de 22 de março de 1916 – o poema publicado foi “Crisântemos”. No decorrer desse ano publicaria ainda outros poemas, como “Rosas” (a 16 de agosto), “Cantando” (26 de abril), “O Teu Olhar” (23 de agosto) e “Junquilhos” (8 de novembro).

A autora do verbete cita uma análise de Fábio Mariano da Silva, segundo a qual “as poesias no periódico foram alteradas em relação ao manuscrito original”, sendo que a troca de correspondência entre a poetisa e a diretora da revista confirma que esta chega a sugerir a introdução de algumas alterações em relação ao texto inicial. “Na poesia ‘O Teu Olhar’ deve substituir a palavra fatal de exagerada acepção para o caso, pela palavra ideal”, escreve Isabelle Carizey de Carvalho.

Por esta altura, Florbela Espanca assinava todas as suas publicações utilizando sempre o sobrenome do seu primeiro marido, Alberto Moutinho, havendo só uma publicação que fugiu a essa regra, logo o primeiro poema, no qual utilizou como pseudónimo o nome da sua madrasta e madrinha, Mariana Espanca.

Uma das secções da “Modas & Bordados” intitulava-se “A Correspondência das Nossas Leitoras” e, nela, Madame Carvalho dedicava-se a responder as dúvidas colocadas pelas leitoras. Foi através deste segmento que Florbela Espanca escreveu a pedir ajuda, “pois estava insegura em relação à qualidade das suas poesias”.

A poetisa enviava com regularidade algumas das suas obras, às quais Madame Carvalho dava o seu parecer, sugerindo alterações, como referido, mas também elogiando o trabalho de Florbela: “Tanto o soneto, que é lindo, como as quadras, após ligeiras emendas, merecem inserção e tê-las-ão”.

Alguns dos poemas citados nesta troca de correspondência – como “Do Meu Alentejo”, “Paisagem”, “O Fado” e “Às Mães de Portugal” – nunca chegaram a ser publicados, certamente por falta de espaço. “O que é interessante sublinhar é o papel que a revista ‘Modas & Bordados’ acabou por adquirir na vida de Florbela Espanca. Para a jovem, nascida e criada no interior alentejano, ouvir os conselhos de alguém cosmopolita e do mundo das letras foi, sem dúvida, uma oportunidade aliciante”, resume Adriana Mello Guimarães.

A autora do verbete acrescenta que a jovem poetisa tornou-se “confidente da (suposta) subdiretora da revista, Júlia Alves, e num tom confessionário de anseios revelou medos, dúvidas, ambições e sonhos ao longo dos anos, em diferentes cartas que hoje em dia nos ajudam a compreender o universo florbeliano”.

A imprensa foi propulsora da carreira da poetisa, segundo Adriana Mello Guimarães, pois “entre 1916 e 1930 vários periódicos portugueses deram protagonismo à poesia de Florbela Espanca” contribuindo para “aumentar o campo de ação florbeliano, ao divulgar e publicitar as suas poesias” e para que a escritora “conseguisse destaque social”.

Editado pelas Edições Esgota- das, “Dicionário de Florbela Espanca” contou com a participação de diversos investigadores das áreas das letras, tendo coordenação de Jonas Leite e Fábio Mário da Silva e direção científica de Maria Lúcia dal Farra.

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