“É chocante olharmos para terrenos de cultivo e vermos centrais solares”

Presidente da Apormor diz que ser “chocante” que terrenos “outrora de cultivo ou pastoreio” estejam agora ocupados por centrais fotovoltaicas. Joaquim Manuel Capoulas lembra que o défice alimentar do país já atinge os 5,5 mil milhões de euros. Luís Godinho (texto)

Presidente da Apormor – Associação de Produtores do Mundo Rural da Região de Montemor-o-Novo, Joaquim Manuel Capoulas não poupa nas palavras: “É chocante para muitos de nós olharmos para terrenos, outrora de cultivo ou de pastoreio, agora ocupados, em largas dezenas ou centenas de hectares, por centrais fotovoltaicas, que daqui a 15 ou20 anos estarão obsoletas e a necessitarem de ser substituídas, com a consequente produção de enorme quantidade de resíduos de difícil e dispendioso tratamento”.

No discurso de abertura da Feira da Luz/Expomor, a decorrer até ao próximo dia 2 de setembro em Montemor-o-Novo, Joaquim Capoulas reconheceu que aproveitamento da energia solar “é muito importante, tanto do ponto de vista ambiental como económico”, mas referiu que essa utilização “não deve” ser feita em “terrenos com boa aptidão agrícola, só porque aí a instalação é mais fácil e mais barata”. Alertando para o facto da “exploração das energias renováveis gerar grandes negócios, produtores de enormes receitas, constituindo lobys poderosos que permitem ultrapassar muitos obstáculos”. Em detrimento da agricultura.

“Para alguns”, acrescenta, “o alvo a abater, continuam a ser as nossas pobres vaquinhas, ovelhinhas e cabrinhas que muito contribuem, nas quantidades adequadas a cada área de pastoreio, para a limpeza do excesso de vegetação, para a fertilização do solo e para a criação de riqueza, de que todos podemos beneficiar. Riqueza que não se cria é distribuição que não se pode fazer”. 

Acresce que o desequilíbrio da balança alimentar do país ultrapassou, o ano passado, os 5,5 mil milhões de euros, mais 315 milhões face ao ano anterior. “Na redução da produção nacional foi o setor das carnes a representar o maior contributo (1362 milhões de euros) para o défice da balança alimentar, superando o dos cereais, outro setor a merecer atenção urgente”, disse Joaquim Capoulas, recordando que o país apenas produz 35% da carne de bovino que consome.

“Uma grande parte dos 32.500 animais apresentados, anualmente, nos leilões da Apormor acabam por ser vendidos para Espanha, o que faz aumentar ainda mais a dependência das importações, principalmente da América do Sul, com condições de produção que não cumprem com as exigências a que somos obrigados na União Europeia, nomeadamente quanto ao bem estar animal, ao estatuto sanitário, às condições de transporte, para já não falar na emissão para a atmosfera dos gases da queima das muitas toneladas de combustíveis fósseis do transporte marítimo”, criticou.

Considerando que o mundo rural “está em sofrimento”, em resultado de fatores como os “radicalismos ambientalistas” da nova Polícia Agrícola Comum que entrou em vigor em 2023 e que “baixou muito os apoios à produção pecuária do extensivo, o que aliado à baixa rentabilidade das vendas, constituiu um forte desincentivo à atividade”, ou de dois anos consecutivos de seca, “que obrigaram os agricultores a vender uma parte dos efetivos, para conseguirem alimentar os restantes animais”, o presidente da associação assinalou que no Alentejo se tem vindo a assistir a uma “redução acentuada dos efetivos das espécies pecuárias do pastoreio extensivo e de produção cerealífera”, substituída “por culturas permanentes de regadio de muito maior rentabilidade, pelo menos no imediato”

Por isso, “com a diminuição da produção e o aumento do consumo na União Europeia, o défice da balança alimentar aumenta e a soberania alimentar do país e da Europa corre sérios riscos, agravados com as previsíveis consequências dos conflitos a nível mundial”. A solução, defende Joaquim Capoulas, é aproveitar os recursos naturais, contribuindo para uma menor dependência externa do setor agroalimentar. 

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