O fotógrafo Gonçalo C. Silva, licenciado pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, a convite da Ci.CLO, esteve em residência artística na Aldeia da Luz, durante três momentos. O primeiro foi em maio deste ano, permitindo-lhe explorar o território que até à data lhe era desconhecido e perceber, a partir daí, que rumo iria dar a este projeto. O mais recente decorreu em agosto e setembro, já com o objetivo de captar, à margem do maior lago artificial da Europa, imagens capazes de refletir temáticas como as alterações climáticas, aprofundando questões como a escassez e abundância de água e do natural versus o tecnológico.
Além de Alqueva, o projeto “Sustentar”, com curadoria de Krzysztof Candrowicz, Pablo Berástegui e Virgílio Ferreira, leva nesta edição fotógrafos a Loulé, ao Porto e a Vila Real. É um processo criativo organizado em dois eixos estruturantes: a parte processual das residências, em que o artista é colocado em contacto com empreendimentos que forneçam uma resposta a problemáticas relacionadas com a sustentabilidade no meio urbano; e a parte programática, relativa às exposições e atividade de mediação.
Sendo que a primeira, segundo Virgílio Ferreira, fundador e diretor da plataforma Ci.CLO, “é invisível aos olhos do público”. Esta é uma plataforma “de pesquisa, criação e ação na área da fotografia que estabelece uma relação transdisciplinar com outros campos artísticos, ambientais e sociais para abordar criticamente preocupações e emergências do nosso tempo”. Em última instância procura-se contribuir para “uma regeneração socio-ecológica através das artes”.
Através da sua câmara, Gonçalo C. Silva dará a conhecer o trabalho desenvolvido pela Empresa de Desenvolvimento de Infraestruturas do Alqueva (EDIA). Ao longo destes períodos, esteve em contacto direto com os especialistas da empresa, que o “contextualizaram sobre como é que é feita a manutenção, a gestão e mesmo a vigilância da água do lago”. Os técnicos explicaram. Gonçalo fotografou. Fotografou bastante, com especial destaque para as Barragens de Alqueva e de Pedrogão, e para a estação elevatória dos Álamos.
A terceira edição do “Sustentar”, na linha das anteriores, assume o propósito de “promover uma maior consciencialização crítica sobre as vulnerabilidades ecológicas e sociais do país” e regressa, também, à região do Alqueva, que já tinha recebido a primeira edição do projeto, em 2020.
“Tinha bastante curiosidade pelo Alentejo, também por ser no verão, tive sempre curiosidade de como é que seria, nesse período, fotografar sobre um tema que é água. Portanto, logo este contraste de estar no interior do Alentejo, no verão, a fotografar água ou falar sobre a água. E este foi o ponto de partida do projeto, aquilo que me convidaram para explorar através da fotografia”, refere.
Ao descrever o seu processo criativo, Gonçalo C. Silva afirma que o foco deste projeto fotográfico é o “lado que normalmente está invisível, ou, de forma metamórfica, o lado que está submerso no grande lago”. Em contraste com a vastidão de água, realça que o que o “interessou verdadeiramente foi a outra componente mais artificial à volta da albufeira. A parte artificial, invisível e submersa”. Partindo da premissa que a albufeira de Alqueva surgiu da construção da barragem, revela-se notória a dualidade entre o natural e o artificial neste território, uma vez que este lago “é profundamente artificial no sentido da sua criação”.
Introduz, também, a questão das alterações climáticas através da exploração dos aparelhos, metodologias e processos que ajudam o Alentejo a lidar com esta problemática, nomeadamente com a escassez de água, com a aridez do solo e a consequente dificuldade em produzir [produtos agrícolas].
Nas exposições que irá apresentar, refere, será possível observar “soluções e mecanismos para lidar com as alterações climáticas e ajudar as populações e os ecossistemas”. Mesmo quando a presença da água não passa de sugestão: “Quando, por exemplo, estamos a ver as condutas e a seguir aqueles vasos sanguíneos que são as tubagens através das quais a água é transportada para locais tão longe como Évora, não a vemos, mas sabemos que a água esta lá dentro a ser conduzida e transportada”.
Com o apoio da EDIA e do Museu da Luz, os resultados deste trabalho serão materializados em duas exposições. Na próxima edição da Bienal de Fotografia do Porto, de 15 de maio a 29 de junho de 2025, e depois no Museu da Luz, em junho de 2025.
Em relação à bienal de fotografia, Gonçalo revela a ter expectativas “bastante elevadas”, uma vez que vai estar a participar com uma mostra individual. Todavia, admite ser o seu maior propósito “devolver este trabalho à região do Alentejo”, assegurando que muitos dos sítios que surgem nas fotografias nunca foram vistos por grande parte da população.
REGISTAR A RELAÇÃO DO HOMEM COM A NATUREZA
Nascido em 1997, Gonçalo C. Silva vive e trabalha em Lisboa. Estudou na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa e no Atelier de Lisboa, e está atualmente a fazer um mestrado na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. No seu trabalho, que aplica uma abordagem artística à fotografia, Gonçalo aborda temas relacionados com a representação da paisagem e com a relação entre o homem e a natureza, centrando-se nos emaranhados de património, presença, identidade e pertença. Nos seus projetos, a interligação de imagens de diferentes contextos cria novos significados e narrativas com um forte carácter simbólico, relacionado com as experiências pessoais do artista.