Para emitir opinião, fundamentar posições, defender convicções ou formular juízos, entendo que é determinante conhecer, estudar, ter princípios, ideais e valores. Mas além de tudo isto é fundamental viver a realidade do dia a dia e conhecer as dificuldades reais das pessoas. Demasiadas vezes, quem decide e influencia na sociedade, vive numa bolha e não vê, ou não entende as complexidades e os dilemas para um grande número de pessoas.
Todas estas conjeturas e condicionantes têm-me demonstrado que há algo determinante nas relações humanas, na superação de dificuldades, no apontar de caminhos, ou tão simplesmente no ajudar: são as pessoas com quem nos cruzamos. Evidentemente, há as orientações que têm de ser respeitadas, mas o humanismo, a sensibilidade, a compreensão, o afeto e o profissionalismo de cada um, podem tornar possível fazer diferente, muitas vezes até sem se encontrar as soluções desejáveis.
Para o ilustrar, partilho uma situação vivida por um familiar direto que viveu até aos 93 anos. Um homem bom, que trabalhou no campo e nas pedreiras, teve uma vida no essencial saudável e autónoma até aos 90 anos. Nos últimos tempos, depois de muitas conversas aceitou entrar no Centro de Dia do Recolhimento de Nossa Senhora dos Mártires (o Albergue como era conhecido).
O seu comentário continuado foi de que poderia ter ido mais cedo, afinal “encontrou lá tantos dos seus amigos, comia-se muito bem e as senhoras eram uma simpatia”. Uma breve passagem pelo Hospital de Évora revelou graves e irresolúveis problemas silenciosos. De regresso a casa, o Recolhimento ajustou-se e com o mesmo humanismo passou a prestar Apoio Domiciliário, em simultâneo com a Equipa Comunitária de Cuidados Paliativos de Estremoz, resposta fundamental para as necessidades globais do doente e da família, promovendo o conforto possível no controlo da dor e na qualidade de vida.
Na reta final da vida foi possível ser acolhido nos Cuidados Paliativos do Hospital São João de Deus em Montemor-o-Novo, onde com todo o humanismo passou os últimos dias.
Constato o avanço civilizacional alcançado em saúde, saliento a importância do Serviço Nacional de Saúde, dos serviços de saúde e de apoio social e os acordos entre o Estado e as Instituições de Solidariedade Social. Mas, destaco como fundamentais as pessoas, a sua entrega, os seus conhecimentos e o seu humanismo como pilares das relações concretas com os utentes que tornam possível intervir a diversos níveis em situações diferentes e para melhor.
Aproveito para agradecer as continuadas provas de humanismo e profissionalismo da Equipa Comunitária de Cuidados Paliativos de Estremoz, à direção e toda a equipa do Recolhimento e à direção médica e pessoal dos cuidados paliativos do Instituto São João de Deus. Foi cada uma das pessoas destas equipas que fez a diferença ao dar conforto e dignidade a este difícil período.