José Emílio Guerreiro: “Estremoz e o seu sistema de fortificações”

Artigo de José Emílio Guerreiro, sociólogo e presidente da Casa da Cultura de Estremoz.

A recente polémica a propósito da derrocada parcial do “muro de suporte” do miradouro do Largo de D. Dinis (antigo Largo do Castelo ), onde se realizaram as primeiras feiras francas, onde se localizava o pelourinho e onde está implantada, desde 1970, a estátua da Rainha Santa Isabel, motivou-me para escrever estas linhas que procuram recordar alguns dos episódios mais marcantes da história de Estremoz, na relação com as suas muralhas.

Antes de mais, importa dizer que o sistema de fortificações de Estremoz é composto por duas cinturas de muralhas.

A medieval, do século XIII, mandada erguer por D. Afonso III e a seiscentista desenhada pelo engenheiro militar Cosmander, jesuíta de origem neerlandesa, contratado pelo Rei D. João IV para trabalhar nas fortalezas da raia. Comecemos, então, pela muralha medieval, respeitando a ordem cronológica dos acontecimentos.

No século XV, a porta que existia no prolongamento da Rua Nova do Castelo, foi tapada para segregar a pequena comunidade judaica ali residente. A rua passou a ser um beco.

Nas vésperas da visita do Rei D. Carlos a Estremoz em 1894, um vereador propôs que fosse entregue ao monarca um pedido de autorização para que a pedra da muralha fosse usada para as obras do concelho.

Em 6 de maio de 1898, foi proposto em sessão camarária “que lhe fossem cedidos os fortes, muralhas e fossos interiores e exteriores, em que se achava estabelecido o matadouro municipal, ao nascente, até ao forte acima da rua do Mauforo, ao poente, com a cláusula de poder vender os terrenos que sobrassem da abertura das ruas para a construção de casas e fábricas…”.

Em fins do século XIX, princípios do século XX, o redente que protegia a porta da Frandina foi arrasado. Na encosta que resultou da demolição, foi construído em 1948 um depósito de água. No início do século XX, um dos torreões que ladeava a porta da Frandina foi destruído. No seu lugar, foi construída uma casa que ocupou o acesso ao baluarte, o qual passou a quintal privado.

Na década de 1960, um troço da muralha de Palhais caiu. E assim se manteve mais de uma década. Ao longo de vários anos, o fosso interior da muralha de Santa Isabel foi sendo aterrado com entulho de obras. Foi transformado num improvisado campo de futebol para os rapazes que frequentavam a Escola Primária do Castelo e a Escola Industrial e Comercial, onde hoje é a Pousada.

Quanto à 2.ª cintura de muralhas, também se podem indicar vários episódios reveladores do valor que Estremoz tem atribuído ao seu património. Em 1869, não houve qualquer pudor em rasgar um troço da muralha para abrir a Porta do Reguengo. Em 1916, começou a demolição do troço da muralha entre a Porta de Santa Catarina e a Porta de Santo António, numa extensão de cerca de dois quilómetros, para haver uma ligação mais directa entre a estação do caminho de ferro e o centro da vila (o Rossio).

Nessa altura, escrevia-se no jornal local que as muralhas eram uma barreira que só serviam para criar dificuldades ao crescimento de Estremoz.

Alguns anos antes, tinha sido demolido o outeiro em terra de Santa Bárbara, que não deixava passar a linha do caminho de ferro. Em 1917, a fábrica de cortiça do Tocha no Baluarte dos Currais ardeu. As estruturas em alvenaria que resistiram ao fogo foram usadas, nas décadas seguintes, como sanitários públicos e local de encontro de amores proibidos.

Só ao fim de quase um século, com a inauguração do Hotel Páteo dos Solares foi restituída dignidade ao sítio. O outeiro de S. José já mal se reconhece, entre as árvores e os arbustos da mata municipal. O Forte de S. José, junto à Esplanada-Parque já serviu de matadouro, de redil de ovelhas e de canil. Continua ao abandono.

Na década de 1980, formou-se um depósito de sucata junto à Porta de Santa Catarina que foi crescendo, perante a passividade das entidades responsáveis. A remoção do ferro velho só foi conseguida pelo Mu- nicípio, no início do século XXI, depois de muito esforço.

A atalaia da Frandina (vulgarmente conhecida por Forca) está em ruínas, em propriedade privada. O soldado que lá estava de vigia foi decisivo para avisar a guarnição militar de Estremoz que estava iminente um ataque à vila pelo exército de Castela co- mandado por D. Juan de Áustria, durante a guerra da Restauração.

Nesta época, o matadouro situava-se no fim da actual Rua do Lavadouro, que, por essa razão, se chamava anteriormente Rua do Matadouro.

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