Caiu outro Governo. Não pela agonia do SNS, pelo preço da habitação ou pelos salários devorados pela inflação.
Suspeitas éticas, uma oposição sedenta de sangue, um país refém. Sempre a mesma peça, os mesmos espetadores, o mesmo palco (onde tantas vezes se representou). A Aliança Democrática durou 344 dias. Tal como na I República (45 governos em 16 anos), vive-se de crise em crise. A história repete-se, mas ninguém lê o roteiro.
Antes, derrubavam-se governos por ideologia. Agora? Caem por escândalos pessoais. O essencial mantém-se. Impostos que engordam lucros e esmagam trabalhadores, leis que alimentam a especulação imobiliária, fundos europeus enterrados em projetos-fantasma. O “cartel da banca” paga multas fictícias. A TAP é privatizada, a Fertagus entra em colapso, as parcerias público-privadas na saúde multiplicam-se. Nada disto derruba governos.
A ética é arma de arremesso. A incompetência? Política de Estado. A justiça revista cidadãos nas ruas, mas ignora ‘offshores’. A Autoridade da Concorrência aplica multas prescritas. O turismo substitui a indústria, as PME asfixiam. Nenhuma moção de censura surge por isto.
As eleições de 18 de maio são um ritual previsível. Muda-se o cenário, a tragédia prossegue. O problema não é a falta de ética. É aceitar um sistema que gira em falso. Enquanto isso, serviços públicos definham, a Europa ri-se, e os portugueses pagam. Em euros, em esperança, em dignidade.
A I República acabou em ditadura. A atual, mais subtil, caminha para a ditadura do imobilismo: um regime onde todos fingem lutar, mas ninguém ousa mudar o que realmente importa. Resta perguntar: até quando? Enquanto as urnas validarem este ciclo, a democracia será um espetáculo de sombras. Sem ética, sem solução, sem saída.