“Nesta fase de germinação das variedades das espécies cerealíferas, estamos a realizar ensaios de seleção de variedades de cereais, para escolher aquelas que mais se adaptam ao ciclo reprodutivo do tartaranhão-caçador e às regiões onde são cultivadas, numa altura em que esta espécie migra de África para a Península Ibérica”, diz o coordenador da investigação, Joaquim Teodósio.
De acordo com o também biólogo, a cultura de cereais vai permitir aumentar a área de habitat natural desta espécie de aves, já que a ceifa tem um período mais alargado, o que permite uma permanência do tartaranhão-caçador nos territórios a norte e sul de Portugal e na Estremadura espanhola por mais tempo.
“As culturas de cereal de sequeiro, como o trigo, a cevada e o centeio, quando conduzidas com práticas agrícolas compatíveis com a conservação da biodiversidade, podem oferecer condições propícias para a nidificação do tartaranhão-caçador (‘Circus pygargus’). Estas culturas proporcionam uma vegetação densa e estruturada durante a primavera, período em que a espécie escolhe o solo para construir os seus ninhos”, explicou.
O especialista em avifauna acrescentou ainda que, na altura e densidade, as plantas oferecem camuflagem contra predadores e proteção contra as condições climáticas, favorecendo o sucesso da incubação e a sobrevivência das crias, numa combinação entre alimento abundante e tranquilidade relativa fundamentais para o bem-estar da espécie durante a época reprodutora.
“No entanto, para que estas culturas sejam efetivamente seguras, é essencial o envolvimento dos agricultores em práticas de gestão adequadas, como o adiamento da ceifa nas zonas com ninhos ou a proteção ativa destes, garantindo assim a coexistência entre a produção agrícola e a conservação desta ave ameaçada”, precisou Joaquim Teodósio
Atualmente as 20 espécies cerealíferas já estão germinadas, o que dá a possibilidade de verificar as que mais se adaptam aos territórios ibéricos e ao clima da região onde são cultivadas.
“A primeira campanha de ensaios de seleção das variedades de cereais arrancou em dezembro de 2024, na Quinta do Valongo, em Mirandela, [Bragança] num total de 20 variedades testadas das espécies trigo mole, trigo barbela, centeio, aveia e triticale. As mesmas variedades também estão a ser testadas em ensaios no Polo de Inovação de Elvas do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV)”, acrecsnetou o investigador.
Escolher cereais que respeitem o ciclo de vida desta espécie não é apenas salvar o tartaranhão, “é promover paisagens agrícolas mais biodiversas e sustentáveis para todos, com uma valorização de práticas amigas das aves e dos consumidores”.
Todos os anos, diversos fatores ameaçam esta espécie de aves, causando a mortalidade e/ou uma grande redução do sucesso da reprodução, colocando em risco a sua sobrevivência em Portugal e Espanha.
“Um fator importante”, prossegue, “é a perda de habitat, devido ao declínio acentuado da área semeada com cereais e a sua substituição por culturas permanentes, ou outros tipos de uso do solo, como a construção de infraestruturas”.
O Projeto “LIFE SOS Pygargus” tem 11 milhões de euros para salvar o tartaranhão-caçador da extinção. A iniciativa conta com 17 parceiros, dos quais 13 são entidades portuguesas e quatro são espanholas, incluindo universidades, empresas, ONG, associações ambientais, Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) e a Comissão de Coordenação Regional do Norte (CCDR-N), sendo coordenado pela Associação Palombar, com sede em Vimioso, no distrito de Bragança.
Fotografia | Yves Adams/BirdLife Europe