Risco de derrocada levou ao encerramento do Águias d’Ouro

A Câmara de Estremoz determinou o “encerramento imediato” do café restaurante Águias d’Ouro, um dos mais emblemáticos edifícios da cidade. A decisão foi tomada tendo em conta “riscos de segurança” para clientes e funcionários. Empresa concessionária estranha ‘timming’ da decisão. Ana Luísa Delgado (texto) e Hugo Francisco (fotografia)

Em comunicado, a Câmara revela que no passado mês de abril o proprietário alertou o Município para o “agravamento da situação da estabilidade do segundo e [do] terceiro piso” do imóvel, que continuava aberto ao público, defendendo a adoção das “medidas urgentes e necessárias para evitar qualquer tipo de ocorrência que ponha em causa a segurança de pessoas e bens, quer no interior quer no exterior do edifício”.

Os problemas terão sido identificados há, pelo menos, dois anos, tendo agora o proprietário do imóvel alertado a Proteção Civil para as condições do edifício. “Fez-se uma vistoria conjunta [entre a Proteção Civil e a Câmara de Estremoz] e em função do relatório elaborado foram tomadas decisões”, diz o presidente do Município, José Daniel Sádio, acrescentando que o proprietário “foi notificado para o fecho, mas também para salvaguardar a segurança” na zona.

O encerramento apanhou de surpresa a empresa que estava a gerir o Águias d’Ouro. “Um despacho do Município de Estremoz (…) decretou o encerramento imediato do nosso estabelecimento, sem direito a audiência prévia, pelo facto de se tratar de uma situação de elevado grau de perigosidade, uma vez que segundo eles há risco iminente de desmoronamento do edifício”, esclareceu a empresa.

“Iremos por isso acatar a decisão, até porque não nos foram dadas alternativas, no entanto estranhamos o timing desta súbita decisão já que a situação era já acompanhada pelo Município de Estremoz há mais de dois anos”, acrescentou ainda a empresa, sublinhando que “tudo mudou de repente agora no verão com esta rápida decisão, no inverno quando choveu grandes quantidades de água, pelos vistos não existia risco nenhum”.

De acordo com a Câmara de Estremoz, em maio, uma vistoria conjunta da Autoridade Nacional de Proteção Civil e do Gabinete Municipal de Proteção Civil constatou “o agravamento da situação de estabilidade”, do edifício apontando a existência de “vários riscos de segurança relativamente à utilização do mesmo”.

“Em resumo”, refere o Município, “o prédio não apresenta condições de segurança para a sua utilização”. Daí ter sido determinado o seu encerramento imediato, “pelo risco que representa, tanto para os funcionários, como para os clientes do interior e da esplanada, bem como para os transeuntes que passam em frente ao mesmo”, bem como o “reforço da rede existente, para contenção das peças decorativas em mármore no terraço e se necessário o reforço da colagem das mesmas”.

A Câmara determinou igualmente o encerramento da esplanada e a colocação de um tapume com dois metros de altura, “para que os peões possam transitar em segurança no passeio”, além da contratação de uma empresa especializada para a avaliação mensal “do estado geral do edifício”.

Ainda de acordo com a mesma fonte, as medidas “foram comunicadas” ao proprietário a 22 de maio, mas a 3 de junho a fiscalização constatou “o incumprimento do preconizado nas medidas imediatas, pelo que, pela gravidade dos factos, viu-se o Município obrigado a ordenar o despejo administrativo” do edifício.

“Ao Município”, acrescenta o comunicado, “apenas cabe acautelar e zelar pela segurança de pessoas e bens, não se imiscuindo em situações entre particulares, pelo que continuará a monitorizar a situação neste edifício, ex-libris da cidade, encetando todas as diligências necessárias para garantir a segurança de pessoas e bens”.

Classificado como Imóvel de Interesse Público desde 2002, o Águias d’Ouro foi inaugurado a 4 de abril de 1901, segundo projeto do arquiteto Jorge Santos Costa. A fachada divide-se em três registos, marcados por sete vãos, todos deliberadamente dissemelhantes entre si, e é rematada por uma pequena platibanda decorada com flores de lis e pináculos em cantaria, dispostos alternadamente. No interior apresenta espaços diferenciados, sendo o piso térreo destinado a armazém e café, o primeiro piso a restaurante e o segundo a habitação.

A sua arquitectura ecléctica, especialmente visível na linguagem decorativa da fachada, torna-o num dos melhores exemplares do património edificado do concelho de Estremoz. Era um raro sobrevivente dos antigos cafés de tertúlia portugueses de início do século XX, considerado como “uma referência sociológica importante e um marco da memória colectiva da cidade”.

“NÃO POSSO ACREDITAR”

A notícia do encerramento do Águias d’Ouro provocou diversas reações nas redes sociais, incluindo na página da associação Estremoz Terra de Encantos. “Não posso acreditar”, escreveu Adelino Silva. “Espero que, pelo bem da cidade e dos inquilinos que a situação se resolva”, acrescentou Michele Marques, dizendo esperar igualmente que o Município “não feche os olhos para outros milhares de prédios que põem em risco a nossa vida todos os dias”. E deixou uma sugestão: “passem pela Vasco da Gama ou mesmo pela Magalhães de Lima, estão lá belos exemplos”. “É com grande tristeza que tomo conhecimento desta decisão, não só por se tratar deste edifício, mas por ser um local que me traz muito gratas recordações da minha juventude na minha terra natal”, sublinhou Vitória Serrano, enquanto Isabel Oliveira desabafava: ““Que não seja para demolir (…) “é crime deixar cair este monumento”.

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